domingo, 29 de novembro de 2009

Evangélico gay diz que a Rádio Melodia não tem o direito de manipular a opinião pública.

Abaixo segue o e-mail enviado por um evangélico para a Rádio Melodia expressando sua revolta sobre o debate “Pastores gays se casam, será o final dos tempos?”


"Escrevemos e ligamos para a produção da Rádio requerendo nossa participação no debate, já que serão quatro debatedores para falar malda nossa igreja e nem um a favor, o que não se configura um debate,mas sim uma forma de estimular o preconceito religioso. Entretanto recebemos uma ligação da produção do programa informando que nos foi negada a participação, porque se trata de uma ordem diretada cúpula da rádio."

O E-MAIL


Prezados Srs.

Venho por meio deste email mui respeitosamente manifestar a minha indignação enquanto cidadão e cristão. Sou membro da Igreja Cristã Contemporânea e como tal, sou ouvinte da Rádio Melodia, a qual muitoedifica minha vida espiritual com os louvores.
Venho percebendo que vocês estão colocando vinhetas do debate desexta-feira referente ao casamento dos meus pastores. Vocês não tem odireito de utilizar um veículo público, colocando uma versão unilateral. Vocês não tem o direito de manipular a opinião pública sem dar a chance do outro lado se manifestar. Vivemos num país laico, de livre manifestação de crenças. Não precisa ser um grande conhecedor danossa Constituição para saber que isso não é um favor, é DIREITO e todo direito deve ser cumprido, inclusive, se for infringido, a pena de lei. Entendo e concordo que vocês tem o direito de também exporem as suas opiniões, mas desde que seja de uma forma democrática. Tenho certeza de que nossos pastores não se intimidariam em participar desse debate.

Por mais que nossos irmãos em Cristo critiquem, ninguém, absolutamente ninguém pode nos privar do direito de manifestarmos nossa crença (isso enquanto a lei dos homens - segundo a Contituição), mas o que mais nos importa é referente à questão espiritual, essa a ninguém cabe odireito de julgar e condenar, a não ser o nosso Senhor Jesus Cristo. Vocês criticam o que não conhecem, vocês não conhecem o nosso ministério, apenas criticam. Sei que pra vocês isso pouco importa, mas centenas de pessoas estão tendo suas vidas restauradas, mudadas através do nosso ministério.

Muitas são as pessoas que chegam até a nossa igreja com suas vidas destruídas, sem perspectiva nenhuma de melhoras, doentes da alma e após um verdadeiro encontro com Deus são restauradas.
Muitas dessas pessoas, meus amados, já são conhecedoras da palavra, já tiveram alguma vivência em igrejas cristãs e de tanto serem"massacradas" com palavras de maldição se desviaram, pessoas que tinham chamados pra obra, pessoas que tinham funções importantes dentro de congregações e eram verdadeiramente bênçãos usadas pelo Senhor, até então serem descubertas e julgadas não por Deus, mas pelohomem, muitas delas com feridas profundas por serem expulsas de seusministérios.Vocês jamais entenderiam, mas ser homossexual não é nenhuma maldição.

Como homossexual, cristão convertido e muito feliz afetivamente (sou casado com meu companheiro há 8 anos e fazemos a obra de Deus juntos) posso dizer que já nascemos assim, como a própria palavra diz, fomos constituidos por Deus desde o ventre de nossas mães e consequentemente, assim como nascem pessoas negras, brancas, destras, canhotas, de olhos claros, assim também nascemos homossexuais. Sei que vocês já estariam com alguns versículos prontos pra sengundo as suas interpretações, tentarem intimidar o meu direito de ser gay e cristão. Eu digo a vocês que, através de um homem ungido, cheio dapresença de Deus e que tem um chamado importantíssimo pra resgatar um povo que até então não era povo, existe uma nova realidade, nós homossexuais podemos sim ter uma vida de santidade, podemos sim termos intimidades com Deus... Ao contrário do que vocês pensam, temos um estudo aprofundado na palavra, inspirado pelo Espírito Santo e deautoria de nosso pastor presidente Marcos Gladstone que mostra o que há séculos vem acontecendo, esse estudo dentro da palavra dismistifica a interpretação tendenciosa e preconceituosa quanto à homossexualidade. Inclusive, senhores, esse material, assim como vídeos, testemunhos, estão disponíveis no site de nossa igreja, que acredito que deva ser bem conhecido e acessado pelos senhores. Creio eu que nenhum dos senhores se permitiram ainda a ir a um de nossos cultos, mas só se preocupam em criticar. Procurei neste email não discutir questões específicas da bíblia sobreo que vocês dizem ser condenável aos olhos de Deus, pois tem os conteúdo bíblico pra termos um debate democrático em relação a essa questão.

Acho interessante vocês convidarem o nosso pastor pra estar no debate, como disse, ele é um homem destemido e consciente da missão dele aqui neste mundo (levar o amor verdadeiro de Deus a todos)Vocês na chamada para o debate, dizem " será o final dos tempos?"...Eu diria que sim, pelo que podemos ver em nosso dia a dia, estamos realmente chegando no fim dos tempos. Como conhecedores e tementes à palavra de Deus, cremos nisso... Inclusive cremos que a palavra de Deus é bem clara quando diz que nenhum dos seus ficaria de fora, nenhuma de suas nações ficaria de fora.


Glória a Deus, sabemos que hoje existe uma porta para nós homossexuais sermos verdadeiramente cristãos e assim buscarmos dia a dia a nossa salvação e propagar oamor de Deus a todos.Temos consciência de que seremos criticados pelos demais irmãos de outras denominações, mas até o ministério do Senhor Jesus aqui na Terra foi criticado por fariseus, imaginem nós, uma nação que antesera somente massacrada e hoje existe uma parcela dela que veio prafazer a diferença nessa geração, que veio pra ser um referencial, pra quebrar cadeias, pra proclamar o nome do Senhor, pra mostrar que é possível ser cristão, não pela aprovação da sociedade, mas sim pela UNICA que nos interessa, a do nosso Senhor Jesus Cristo. Saibas, irmãos, que estaremos orando pra que Deus revele a vocês ainjustiça que vem fazendo. Cremos num Deus justo e verdadeiro, cremos que esse Deus que tanto vem fazendo por nós, é o mesmo que vocês buscam.

Creio, em nome de Jesus, que vocês ainda reconhecerão o nosso ministério como sendo um ministério pra resgatar das trevas um povoque até então era estigmatizado por condenação.
Espero que entendam o meu posicionamento. Como homem de Deus, nãoposso ver o ministério em que faço parte ser injustiçado. Continuarei sendo ouvinte assíduo da Rádio Melodia, mas não aceito e não concordocom a manipulação de idéias. Já diz um ditado secular " quem não devenão teme", porque vocês não convidam os pastores para estarem aí nasexta-feira?Aproveito também pra fazer uma correção, toda vez que vocês se referirem aos gays pela nomenclatura técnica, não digam homossexualismo, o sufixo "ismo" indica doença e já foi comprovado quenão é, digam homossexualidade. Também não usem o termo opção, ninguémopta por ser homossexual. Você optou em ser hétero? Digam sempre orientação sexual.

Graça e paz!

Márcio

Vamos Ajudar!!!

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Revelação do inferno por Santo Anselmo

1. Jazem nas trevas exteriores. Pois, lembrai-vos, o fogo do inferno não emite nenhuma luz. Assim como, ao comando de Deus, o fogo da fornalha babilônica perdeu o seu calor mas não perdeu a sua luz, assim, ao comando de Deus, o fogo no inferno, conquanto retenha a intensidade do seu calor, arde eternamente nas trevas.

2. E uma tempestade que nunca mais acaba de trevas, de negras chamas e de negra fumaça de enxofre a arder, por entre as quais os corpos estão amontoados uns sobre os outros sem uma nesga de ar. De todas as pragas com que a terra dos faraós foi flagelada, uma praga só, a da treva, foi chamada de horrível. Qual o nome, então, que devemos dar às trevas do inferno, que hão de durar não por três dias apenas, mas por toda a eternidade?

3. O horror desta estreita e negra prisão é aumentado por seu tremendo cheiro ativo. Toda a imundície do mundo, todos os monturos e escórias do mundo, nos é dito, correrão para lá como para um vasto e fumegante esgoto quando a terrível conflagração do último dia houver purgado o mundo. O enxofre, também, que arde lá em tão prodigiosa quantidade, enche todo o inferno com o seu intolerável fedor; e os corpos dos danados, eles próprios, exalam um cheiro tão pestilento que, como diz São Boa-ventura, só um deles bastaria para infeccionar todo o mundo.

4. O próprio ar deste mundo, esse elemento puro, torna-se fétido e irrespirável quando fica fechado longo tempo. Considerai, então, qual deva ser o fétido do ar do inferno. Imaginai um cadáver fétido e pútrido que tenha jazido a decompor-se e a apodrecer na sepultura, uma matéria gosmenta de corrupção líquida. Imaginai tal cadáver preso das chamas, devorado pelo fogo do enxofre a arder e a emitir densos e horrendos fumos de nauseante decomposição repugnante. E a seguir imaginai esse fedor malsão multiplicado um milhão e mais outro milhão de milhões sobre milhões de carcaças fétidas comprimidas juntas na treva fumarenta, uma enorme fogueira de podridão humana. Imaginai tudo isso e tereis uma certa idéia do horror do cheiro do inferno.

5. Mas tal fedentina não é, horrível pensamento é este, o maior tormento físico ao qual os danados estão sujeitos. O tormento do fogo é o maior tormento ao qual o demo tem sempre sujeitado suas criaturas. Colocai o vosso dedo por um momento na chama duma vela e sentireis a dor do fogo. Mas o nosso fogo terreno foi criado por Deus para benefício do homem, para manter nele a centelha de vida e para ajudá-lo nas artes úteis, ao passo que o fogo do inferno é duma outra qualidade e foi criado por Deus para torturar e punir o pecador sem arrependimento.

6. O nosso fogo terrestre, outrossim, se consome mais ou menos rapidamente, conforme o objeto que ele ataca for mais ou menos combustível, a ponto de a ingenuidade humana ter-se sempre entregado a inventar preparações químicas para garantir ou frustrar a sua ação. Mas o sulfuroso breu que arde no inferno é uma substância que foi especialmente designada para arder para sempre e ininterruptamente com indizível fúria. Além disso, o nosso fogo terrestre destrói ao mesmo tempo que arde, de maneira que quanto mais intenso ele for mais curta será a sua duração; já o fogo do inferno tem esta propriedade de preservar aquilo que ele queima e, embora se enfureça com incrível ferocidade, ele se enfurece para sempre.

7. O nosso fogo terrestre, ainda, não importa que intensidade ou tamanho possa ter, é sempre duma extensão limitada; mas o lago de fogo do inferno é ilimitado, não tem praias nem fundo. E está documentado que o próprio demônio, ao lhe ser feita a pergunta por um soldado, foi obrigado a confessar que se uma montanha inteira fosse jogada dentro do oceano ardente do inferno seria queimada num instante como um pedaço de cera. E esse terrível fogo não aflige os danados somente por fora, pois cada alma perdida se transforma num inferno dentro de si mesma, o fogo sem limites se enraivecendo mesmo em sua essência. Oh! Quão terrível é a sorte desses desgraçados seres! O sangue ferve e referve nas veias; os cérebros ficam fervendo nos crânios; o coração no peito flamejando e ardendo; os intestinos, uma massa vermelha e quente de polpa a arder; os olhos. coisa tão tenra, flamejando como bolas fundidas.

8. Ainda assim, quanto vos falei da força, da qualidade e da ilimitação desse fogo é como se fosse nada quando comparado com a sua intensidade, uma intensidade que é justamente tida como sendo o instrumento escolhido pelo desígnio divino para punição da alma assim como do corpo igualmente. Trata-se dum fogo que procede diretamente da ira de Deus, trabalhando não por sua própria atividade, mas como um instrumento da vingança divina. Assim como as águas do batismo limpam tanto a alma como o corpo, assim o fogo da punição tortura o espírito junto com a carne.

9. Todos os sentidos da carne são torturados; e todas as faculdades da alma outro tanto: os olhos com impenetráveis trevas; o nariz com fétidos nauseantes; os ouvidos com berros, uivos e execrações; o paladar com matéria sórdida, corrupção leprosa, sujeiras sufocantes inomináveis; o tato com aguilhões e chuços em brasa e cruéis línguas de chamas. E através dos vários tormentos dos sentidos a alma imortal é torturada eternamente, na sua essência mesma, no meio de léguas e léguas de ardentes fogos acesos nos abismos pela majestade ofendida de Deus Onipotente e soprados numa perene e sempre crescente fúria pelo sopro da raiva da Divindade.

10. Considerai, finalmente, que o tormento dessa prisão infernal é acrescido pela companhia dos condenados mesmos. A má companhia, sobre a terra, é tão nociva que as plantas, como que por instinto, apartam-se da companhia seja do que for que lhes seja mortal ou funesto. No inferno, todas as leis estão trocadas lá não há nenhum pensamento de família, de pátria, de laços, de relações. O danado goela e grita um com o outro, sua tortura e raiva se intensificando pela presença dos seres torturados e se enfurecendo como ele.

11. Todo o senso de humanidade é esquecido. Os lamentos dos pecadores a sofrerem enchem os mais recuados cantos do vasto abismo. As bocas dos danados estão cheias de blasfêmias contra Deus e de ódio por seus companheiros de suplício e de maldições, contra as almas que foram seus companheiros no pecado. Era costume, nos antigos tempos, punir o parricida, o homem que havia erguido sua mão assassina contra o pai, arremessando nas profundezas do mar num saco dentro do qual também eram colocados um galo, um burro e uma serpente.

12. A intenção desses legisladores, que inventaram tal lei, a qual parece cruel nos nossos tempos, era punir o criminoso pela companhia de animais malignos e abomináveis. Mas que é a fúria dessas bestas estúpidas comparada com a fúria da execração que rompe dos lábios tostados e das gargantas inflamadas dos danados no inferno, quando eles contemplam em seus companheiros em miséria aqueles mesmos que os ajudaram e incitaram no pecado, aqueles cujas palavras semearam as primeiras sementes do mal em pensamento e em ação em seus espíritos, aqueles cujas sugestões insensatas os conduziram ao pecado, aqueles cujos olhos os tentaram e os desviaram do caminho da virtude? Voltam-se contra tais cúmplices e os xingam e amaldiçoam. Não terão, todavia, socorro nem ajuda; agora é tarde demais para o arrependimento.

13. Por último de tudo, considerai o tremendo tormento daquelas almas condenadas, as que tentaram e as que foram tentadas, agora juntas, e ainda por cima, na companhia dos demônios. Esses demônios afligirão os danados de duas maneiras: com a sua presença e com as suas admoestações. Não podemos ter uma idéia de quão terríveis são esses demônios. Santa Catarina de Siena uma vez viu um demônio e escreveu que preferia caminhar até o fim de sua vida por um caminho de carvões em brasa a ter que olhar de novo um único instante para tão horroroso monstro.

14. Tais demônios, que outrora foram formosos anjos, tornaram-se tão repelentes e feios quanto antes tinham de lindos. Escarnecem e riem das almas perdidas que arrastaram para a ruína. É com eles que são feitas, no inferno, as vozes da consciência. Por que pecaste? Por que deste ouvido às tentações dos amigos? Por que abandonaste tuas práticas piedosas e tuas boas ações? Por que não evitaste as ocasiões de pecado? Por que não deixaste aquele mau companheiro? Por que não desististe daquele mau hábito, aquele hábito impuro? Por que não ouviste os conselhos do teu confessor? Por que, mesmo depois de haveres tombado a primeira, ou a segunda, ou a terceira, ou a quarta ou a centésima vez, não te arrependeste dos teus maus passos e não voltaste para Deus, que esperava apenas pelo teu arrependimento para te absolver dos teus pecados? Agora o tempo para o arrependimento se foi. Tempo existe, tempo existiu, mas tempo não existirá mais!

15. Tempo houve para pecar às escondidas, para se satisfazer na preguiça e no orgulho, para ambicionar o ilícito, para ceder às instigações da tua baixa natureza, para viver como as bestas do campo, ou antes, pior do que as bestas do campo, porque elas, ao menos, não são senão brutos e não possuem uma razão que as guie; tempo houve, mas tempo não haverá mais. Deus te falou por intermédio de tantas vozes, mas não quiseste ouvir. Não quiseste esmagar esse orgulho e esse ódio do teu coração, não quiseste devolver aquelas ações mal adquiridas, não quiseste obedecer aos preceitos da tua Santa Igreja nem cumprir teus deveres religiosos, não quiseste abandonar aqueles péssimos companheiros, não quiseste evitar aquelas perigosas tentações. Tal é a linguagem desses demoníacos atormentadores, palavras de sarcasmo e de reprovação, de ódio e de aversão. De aversão, sim! Pois mesmo eles, os demônios propriamente, quando pecaram, pecaram por meio dum pecado que era compatível com tão angélicas naturezas: foi uma rebelião do intelecto; e eles, estes mesmos, têm que se afastar, revoltados e com nojo de terem de contemplar aqueles pecados indizíveis com os quais o homem degradado ultraja e profana o templo do Espírito Santo, e se ultraja e avilta a si mesmo.

Santa Faustina e a visão do inferno

Hoje, conduzida por um Anjo, fui levada às profundezas do Inferno um lugar de grande castigo, e como é grande a sua extensão. Tipos de tormentos que vi:

1. Primeiro tormento que constitui o Inferno é a perda de Deus;

2. O segundo, o contínuo remorso de consciência;

3. O terceiro, o de que esse destino já não mudará nunca;

4. O quarto tormento, é o fogo que atravessa a alma, mas não a destrói; é um tormento terrível, é um fogo puramente espiritual, aceso pela ira de Deus;

5. O quinto é a contínua escuridão, o terrível cheiro sufocante e, embora haja escuridão, os demônios e as almas condenadas vêem-se mutuamente e vêem todo o mal dos outros e o seu.

6. O sexto é a continua companhia do demônio;

7. O sétimo tormento, o terrível desespero, ódio a Deus, maldições, blasfêmias.

São tormentos que todos os condenados sofrem juntos, mas não é o fim dos tormentos. Existem tormentos especiais para as almas, os tormentos dos sentidos. Cada alma é atormentada com o que pecou, de maneira horrível e indescritível . Existem terríveis prisões subterrâneas, abismos de castigo, onde um tormento se distingue do outro. Eu teria morrido vendo esses terriveis tormentos, se não me sustentasse a onipotência de Deus.

Que o pecador saiba que será atormentado com o sentido com que pecou, por toda a eternidade.

Estou escrevendo por ordem de Deus, para que nenhuma alma se escuse dizendo que não há inferno ou que ninguém esteve "lá e não sabe como é".

Eu, Irmã Faustina, por ordem de Deus, estive nos abismos para falar às almas e testemunhar que o Inferno existe. Sobre isso não posso falar agora, tenho ordem de Deus para deixar isso por escrito. Os demônios tinham grande ódio contra mim, mas, por ordem de Deus, tinham que me obedecer. O que eu escrevi dá apenas uma pálida imagem das coisas que vi. Percebi, no entanto, uma coisa: o maior número das almas que lá estão é justamente daqueles que não acreditavam que o Inferno existisse. Quando voltei a mim, não podia me refazer do terror de ver como as almas sofrem terrivelmente ali e, por isso, rezo com mais fervor ainda pela conversão dos pecadores; incessantemente, peço a misericórdia de Deus para eles. " Ó, meu Jesus, prefiro agonizar até o fim do mundo nos maiores suplícios a ter que vos ofender com o menor pecado que seja."

Consequências da alma ao ir ao inferno segundo Santa Faustina1) A perda de Deus

Então Ele dirá aos que estiverem à Sua esquerda: "Malditos, apartem-se de Mim" (Mt 25:41).

Aqueles serão punidos de uma perda eterna, afastados da face do Senhor e da glõria da Sua força (2 Ts 1:9).

2) O remordimento da conciência

O seu verme não morrerá (Mc 9,48).

3) O destino dos condenados nunca cambiará

"E estes irão para o castigo eterno" (Mt 25:46).

4) O fogo

"Malditos, apartem-se de mim para o fogo eterno" (Mt 25:41).

5) As trevas

Lancem-no para fora, nas trevas (Mt 22:13; Mt 25:30).

6) A companhia Satã

"Então Ele dirá aos que estiverem à Sua esquerda: 'Malditos, apartem-se de Mim para o fogo eterno preparado para o diabo e seus anjos." (Mt 25:41).

7) O desespero

Ali haverá choro e ranger de dentes (Mt 22:13; Mt)

O Sonho de Dom Bosco - O Inferno

Na noite de domingo, 3 de maio de 1869, festa do Patrocínio de São José, Dom Bosco retornou a narração do que tinha visto nos seus sonhos.

- Devo - principiou - contar-vos outro sonho, que se pode considerar conseqüência dos que vos narrei na 5ª e na 6ª feira à noite, os quais me deixaram tão cansado, que dificilmente me podia manter em pé. Chamai-lhes sonhos ou dai-lhes outro nome...; chamai-lhes como quiserdes.

- Por que não falas?

Voltei-me para o lugar de onde procedia a voz e vi junto ao meu leito um personagem distinto. Tendo compreendido o motivo da censura, perguntei-lhe:

- E que deverei dizer a nossos jovens?

- O que viste e te foi dito nos últimos sonhos, e também o que desejavas conhecer, e que te será revelado na próxima noite.

E desapareceu.

No dia seguinte inteiro, estive pensando na péssima noite que haveria de passar; e chegada a hora, não me decidia a ir dormir. Fiquei lendo, sentado à mesa, até meia noite. Enchia-me de terror a idéia de ter que presenciar ainda outros espetáculos terríveis. Fiz, afinal, violência sobre mim mesmo e fui deitar-me.

Para não dormir tão rapidamente, com temor de que a imaginação me levasse aos costumeiros sonhos, apoiei o travesseiro na parede, de modo a ficar quase sentado no leito. Mas, como estava moído de cansaço, sem que me desse conta o sono logo se apoderou de mim. E eis que de repente vejo no quarto, junto a minha cama, o homem da noite anterior, o qual me diz:

- Levanta-te e vem comigo!

- Rogo-te, por caridade - lhe respondi - deixa-me tranqüilo, pois estou cansado demais. Há vários dias sou atormentado pela dor de dentes. Deixa-me descansar. Tive sonhos espantosos; estou extenuado.

Dizia isso também porque a aparição desse homem é sempre sinal de grande agitação, cansaço e terror.

- Levanta-te, que não há tempo a perder! - me respondeu.

Então levantei-me e segui-o. No caminho, perguntei:

- Aonde me queres levar desta vez?

- Vem e verás.

Conduziu-me a um lugar onde se estendia uma imensa planície. Olhei à volta, meã de lado algum conseguia ver os confins dela, de tal forma era ela extensa. Era um verdadeiro deserto! Não aparecia ser vivo algum. Não se via nem uma planta nem um rio; a vegetação seca e amarelecida mostrava aspecto desolador. Não sabia onde me encontrava, nem o que iria fazer. Durante alguns instantes perdi de vista o guia. Receei me ter perdido. Não estavam comigo nem o Padre Rua, nem o Padre Francesia, nem ninguém mais. Eis que descubro de novo o amigo, que vinha a meu encontro. Respirei e lhe perguntei:

- Onde estou?

- Vem comigo e verás.

- Bem, irei contigo.

Caminhava ele na frente e eu o seguia em silêncio. Após uma longa e triste caminhada, pensando que precisaria atravessar toda a imensa planície, dizia para mim mesmo:

- Pobres de meus dentes! Pobre de mim, com as pernas inchadas!...

De repente, sem saber como, aparece diante de mim uma estrada. Rompi então o silêncio, perguntando ao meu guia:

- Aonde vamos agora?

- Por aqui - respondeu-me.

E nos encaminhamos por aquela estrada. Era bonita, larga, espaçosa e bem pavimentada. Via peccantium complanata lapidibus, et in fine illorum inferi, et tenebrae, et poenae (Eclesiástico, 21, 11) [O caminho dos pecadores é muito bem pavimentado, mas no final dele estão o inferno, as trevas e os castigos].

Nos dois lados do caminho, havia duas belíssimas sebes, verdes e cobertas de flores encantadoras. As rosas, especialmente, brotavam por todas as partes entres as folhas. + primeira vista esse caminho parecia plano e cômodo; e sem suspeitar de nada, me pus a caminhar por ele. Mas à medida que prosseguia, notei que ia imperceptivelmente declinado e, ainda que não parecesse muito rápida e descida, sem embargo disso eu corria a uma tal velocidade que parecia estar sendo levado pelo vento. Mais ainda, dei-me conta de que avançava quase sem mover os pés, tão rápida era nossa carreira. Refletindo que retornar depois por uma estrada tão longa me custaria grande esforço e fadiga, perguntei ao amigo:

- Como é que faremos para voltar depois ao Oratório?

- Não te preocupes - me respondeu - o Senhor é onipotente e quer que tu vás. Quem te conduz e te mostra como ir para a frente saberá também reconduzir-te de volta.

O caminho baixava sempre. Continuávamos nosso trajeto por entre flores e rosas, quando, pelo mesmo caminho, vi os meninos do Oratório, juntamente com muitíssimos outros companheiros que eu jamais vira antes, caminhando atrás de mim. E encontrei-me no meio deles. Enquanto os observava, de repente vejo que ora um, oura outro, caíam, e em seguida eram arrastados por uma força invisível rumo a uma horrível encosta que se entrevia à distância, a qual depois vi que ia dar numa fornalha. Perguntei a meu companheiro:

- Que é que faz cair esses jovens? Funes extenderunt in laqueum; iuxta iter scandalum posuerunt (Salmo 139) [Estenderam cordas à maneira de rede; junto do caminho puseram tropeços].

- Aproxima-te um pouco mais - respondeu.

Aproximei-me e vi que os meninos passavam entre muitos laços, alguns postos à altura do chão, outros à altura da cabeça; estes últimos não se viam. Dessa forma, muitos jovens, enquanto caminhavam sem dar-se conta do perigo, eram colhidos pelos laços; no momento de ser colhidos davam um salto, depois caíam no solo com as pernas para o ar e, levantando-se, se punham em desabalada corrida para o abismo. Um era agarrado pela cabeça, outro pelo pescoço, outro pelas mãos, por um braço, por uma perna, pela cintura, e imediatamente depois eram arrastados. Os laços estendidos pela terra, que mal se podiam ver, eram parecidos com estopa. Lembravam uns fios de aranha, e não pareciam muito nocivos. Sem embargo, vi que também os jovens colhidos por tais laços caíam quase todos por terra.

Eu estava espantado. E o guia me disse:

- Sabes o que é isso?

- Um pouco de estopa, não mais do que isso - respondi.

- Menos ainda do que isso; é quase nada - acrescentou. + apenas o respeito humano.

Vendo, entretanto, que muitos continuavam a se enredar nesses laços, perguntei:

- Mas como é que tantos ficam atados por meio desses fios? Quem é que tantos ficam atados por meio desses fios? Quem é que os arrasta desse modo?

- Aproxima-te mais, olha e verás.

Olhei um pouco e disse: - Não estou vendo nada.

- Olha um pouco melhor - repetiu.

Segurei então um dos laços, puxei-o para mim e notei que sua ponta não aparecia; puxei um pouco mais, mas não conseguia ver onde é que terminava aquele fio; pelo contrário, notei que também a mim ele me arrastava. Segui então o fio e cheguei à boca de uma espantosa caverna. Parei, porque não queria entrar naquela voragem; puxei para mim o fio e percebi que ele cedia um pouquinho. Mas era necessário fazer muita força. Depois de muito puxar, pouco a pouco foi saindo fora da caverna um feio e grande monstro que causava repugnância e segurava fortemente um cabo ao qual estavam atados todos os laços. Era ele que, mal caía alguém na rede, imediatamente o puxava para si.

- + inútil - pensei comigo - competir em força com este monstro medonho, porque não sou capaz de vence-lo; o melhor é combate-lo com o sinal da Santa Cruz e com jaculatórias.

Voltei, pois, para junto do meu guia, e ele me disse:

- Já sabes agora o que é?

- Sim! Já sei, é o demônio que estende esses laços para fazer meus jovens caírem no Inferno.

Observei então com atenção os muitos laços e vi que cada um deles lavava escrito seu próprio título: laço da soberba, da desobediência, da inveja, da impureza, do roubo, da gula, da preguiça, da ira etc.

Feito isso, coloquei-me um pouco atrás para observar quais daqueles laços colhiam maior número de jovens. Eram os da impureza, da desobediência e do orgulho. A este último estavam atados os outros dois. Além desses vi muitos outros laços que faziam grande estrago, mas não tanto como os primeiros. Sem parar de observar, vi que muitos jovens corriam mais precipitadamente que outros, e perguntei:

- Por que essa velocidade?

- Porque - foi-me respondido - são arrastados pelos laços do respeito humano.

Olhando ainda mais atentamente, vi que por entre os laços havia muitas facas espalhadas, ali colocadas por mão providencial, e serviam para corta-los e rompe-los. A faca maior era contra o laço do orgulho, e representava a meditação. Outra faca também grande, mas um pouco menor, significava a leitura espiritual bem feita. Havia também duas espadas. Uma delas indicava a devoção ao Santíssimo Sacramento, especialmente com a Comunhão freqüente; a outra, a devoção a Nossa Senhora. Havia também um martelo: a confissão. Havia outras facas, símbolo das várias devoções: a São José, a São Luís de Gonzaga etc. etc. Com estas armas não poucos rompiam os laços quando eram presos, ou se defendiam para não serem atados.

Vi, com efeito, jovens que passavam entre os laços sem nunca serem colhidos: ou passavam antes que o laço caísse, ou sabiam esquiva-lo e o laço escorregava sobre os ombros, sobre as costas, de um lado ou de outro, sem, contudo poder aprisiona-los.

Quando o guia se deu conta de que eu havia observado tudo, fez-me continuar o caminho bordado de rosas que, à medida que avançávamos, iam-se tornando mais raras, ao passo que começavam a se fazer notar enormes espinhos.

Chegamos a um ponto em que, por mais que olhasse, já não encontrava rosa alguma, e no final as sebes se haviam tornado só de espinhos, desfolhadas e secas pelo sol. Das moitas dispersas e ressecadas partiam galhos que serpenteavam pelo solo e impediam o caminho, semeando-o de tal maneira com espinhos que só com grande dificuldade se podia andar.

Havíamos chegado a uma baixada cujas ribanceiras ocultavam as demais regiões vizinhas; o caminho, sempre em declive, se tornava cada vez mais horrível, sem pavimentação, cheio de buracos, degraus, pedras e rochas arredondadas.

Havia perdido de vista a todos os meus jovens, muitíssimos dos quais haviam saído daquele caminho traiçoeiro para tomar outros rumos.

Continuei caminhando. Quanto mais avançava, mais áspera e rápida era a descida, de modo que às vezes resvalava e caía por terra, onde ficava um pouco para retomar o fôlego. De tempos em tempos o guia me sustentava e me ajudava a levantar. A cada passo as articulações se me dobravam e parecia que meu ossos se iam desconjuntar. Ofegante, eu dizia ao que me guiava:

- Meu amigo, minhas pernas já não podem me sustentar: estou tão esgotado que me é impossível prosseguir a caminhada.

O guia não respondeu, mas fazendo-me sinal para ter ânimo continuou o caminho; até que, vendo-me suado e morto de cansaço, conduziu-me a um patamarzinho que havia na entrada. Sentei-me, respirei profundamente e me pareceu descansar um pouco. Eu olhava entrementes o caminho percorrido: parecia quase vertical, semeado de espinhos e pedras ponteagudas. Olhava depois o caminho que ainda devia percorrer e fechava os olhos aturdido. Por fim, exclamei:

- Por caridade, voltemos par trás. Se continuamos adiante, como faremos para retornar ao Oratório? Serme-á impossível subir essa encosta.

O guia respondeu resolutamente:

- Agora que chegamos a este ponto, queres que te deixe só?

Diante da ameaça, exclamei em tom dolorido: - Sem ti, como poderei voltar para trás ou continuar a viagem.

- Pois bem, segue-me - acrescentou.

Levantei-me e continuamos descendo. O caminho se tornava cada vez mais espantoso e intransitável, de modo que mal podia manter-me em pé.

Eis que no fundo desse precipício, que terminava num vale sombrio, apareceu um imenso edifício que exibia, diante de nosso caminho, uma porta altíssima, fechada. Chegamos ao fundo do precipício. Um calor sufocante me oprimia e uma densa fumaça esverdeada se elevava em torno das muralhas, marcadas por chamas cor de sangue. Levantei os olhos para ver a altura dos muros; eram mais altos que uma montanha. Perguntei ao guia:

- Onde é que nos encontramos? Que é isso?

- Lê naquela porta - respondeu - pela inscrição saberás onde estamos.

Olhei e vi escrito na porta: Ubi non est redemptio [onde não há redenção]. Dei-me conta de que estávamos na porta do Inferno.

O guia me levou a fazer o contorno das muralhas daquela horrível cidade. De espaço a espaço, a distância regular, via-se uma porta de bronze como a primeira, também no ponto final de uma espantosa vertente, e todas tinham uma inscrição latina distinta das anteriores.

Discedite, maledicti, in ignem aeternum, qui paratus est diabolo et Angelis eius... Omnis arbor quae non facit fructum bonum excidetur et in ignem mittetur [Afastai-vos, malditos, ide para o fogo eterno que está preparado para o diabo e seus anjos... Toda árvore que não der bom fruto será cortada e lançada ao fogo].

Apanhei um lápis para copiar as inscrições; mas o guia me disse:

- Que estás fazendo?

- Tomo nota destas inscrições.

- Não é preciso; tu as tens todas na Escritura. Algumas delas até as mandaste colocar nas portas [de teu Oratório].

Diante de tal espetáculo, eu teria desejado voltar para trás e marchar para o Oratório; já havia dado alguns passos, mas meu guia nem se moveu. Percorremos um imenso e profundíssimo barranco e novamente nos encontramos diante da primeira porta, aos pés da vertente por onde havíamos descido. De repente o guia recuou e, com o rosto entristecido e desfeito, fez sinal para que me afastasse, dizendo:

- Observa!

Assustado, voltei os olhos para trás e vi a uma grande distância, por aquele rapidíssimo caminho, alguém que caía precipitadamente. Conforme ia se aproximando, procurava fixar-lhe o rosto; afinal reconheci nele um dos meus jovens. Seus cabelos, em parte desordenados e eriçados, em parte lançados para trás por efeito do vento; seus braços, estendidos para adiante em atitude de quem nada para escapar do naufrágio. Queria parar e não podia. Tropeçava nas pedras salientes do caminho e elas mesmas serviam para dar-lhe mais impulso na queda.

- Corramos, vamos Pará-lo e ajuda-lo - dizia eu, enquanto estendia para ele as mãos.

- Não, deixa - dizia-me o guia.

- Por que não posso Pará-lo?

- Não sabes como é terrível a vingança de Deus?

Porventura crês que és capaz de parar alguém que foge da cólera acesa do Senhor?

Entrementes, o jovem, voltando a cabeça para trás e olhando com olhos esbugalhados para ver se a ira de Deus o perseguia, lançava-se ao fundo e ia chocar-se na porta de bronze, como se em sua fuga não pudesse encontrar melhor refúgio.

- Por que - perguntava eu - aquele jovem olha para trás com tanto espanto?

- Por que a ira de Deus atravessa todas as portas do Inferno e vai atormenta-los até em meio do fogo.

De fato, ante aquele encontrão, com estrondo se abriu a porta. Por trás dela abriram-se ao mesmo tempo, com estrondo ensurdecedor, duas, dez, cem, mil portas mais, empurradas pelo jovem que era levado por um torvelinho invisível, irresistível, velocíssimo. Todas essas portas de bronze, uma defronte à outra, embora a grande distância, ficavam um instante abertas. Vi no fundo, muito distante, como que a boca de um grande forno, e enquanto o jovem se precipitava naquela voragem, elevaram-se bolas de fogo. As portas voltaram a fechar-se com a mesma rapidez com que se haviam aberto. Tirei então minha caderneta para escrever o nome e o sobrenome daquele desgraçado, mas o guia, segurando-me pelo braço, intimou-se:

- Espera e observa novamente.

Olhei e presenciei outro espetáculo. Vi que por aquela vertente se precipitavam outros três jovens das nossas casas, os quais, à maneira de três pedras, rolavam rapidissimamente um após o outro. Tinham os braços abertos e urravam de terror.

Chegaram ao fundo e foram bater na primeira porta. No mesmo instante, reconheci todos os três. A porta se abriu e, por trás delas, as outras mil; os jovens foram empurrados no compridíssimo corredor, ouviu-se um prolongado rumor infernal, que se afastava mais e mais, e desapareceram, cerrando-se as portas.

Muitos outros pouco a pouco foram caindo atrás desses. Vi cair um pobrezinho empurrado por um pérfido companheiro. Uns caíam sós, outros acompanhados; uns seguros pelo braço e outros soltos, ainda que bastante juntos uns dos outros. Todos levavam escrito na fronte o seu pecado. Eu os chamava com grande aflição, enquanto caíam. Mas os jovens não me ouviam; retumbavam as portas infernais ao abrir-se, fechavam-se depois, e seguia-se um silêncio sepulcral.

- Eis uma das causas principais de tantas condenações - exclamou meu guia - maus livros, maus companheiros e hábitos perversos.

Os laços que antes havia visto eram os que arrastavam os jovens ao precipício. Ao ver caírem tantos deles, disse com voz desolada:

- Mas então é inútil trabalharmos em nossos colégios, se tantos são os rapazes aos quais aguarda esse fim. Não haverá nenhum outro remédio para impedir a perda de tantas almas?

Respondeu o guia: - Esse é o estado atual em que se encontram, e se morressem, para cá viriam sem mais.

- Nesse caso, deixa-me anotar seus nomes para que eu possa avisa-los e pô-los no caminho do Paraíso.

- E crês que alguns deles, avisado, se corrigiriam?

Num primeiro momento, o aviso os impressionará; depois o desprezarão, dizendo: "+ um sonho!", e ficarão piores do que antes. Outros, sabendo-se descobertos, freqüentarão os Sacramentos, mas sem boa vontade e sem mérito, porque não o farão bem. Outros se confessarão, mas só por temor momentâneo do Inferno, sem arrancar de seu coração o afeto ao pecado.

- Não há, então, remédio para esses desgraçados? Dá-me um remédio que possa salva-los.

- Eles têm superiores: que lhes obedeçam! Têm um regulamento: que o observem! Têm os Sacramentos: que os freqüentem!

Nesse meio tempo, precipitou-se outro bando de jovens, e as portas ficaram abertas por uns instantes.

- Entra tu também - me disse o guia.

Retrocedi horrorizado. Estava com a idéia de que devia voltar logo ao Oratório para avisar os jovens e segura-los pra que nenhum se perdesse. Mas o guia insistiu:

- Vem, e aprenderás muitas coisas. Diz-me, antes, porém: queres ir só ou acompanhado?

Disse isso para que eu reconhecesse a insuficiência de minhas forças, e ao mesmo tempo a necessidade de sua benévola assistência. Respondi:

- Só?! A esse lugar de horrores?! Sem ser ajudado por tua bondade?! Quem é que me poderia ensinar o caminho de volta?

Mas no mesmo instante senti-me cheio de coragem, pensando comigo mesmo:

- Só pode ir para o Inferno quem já foi julgado, e eu ainda não o fui.

Em conseqüência, exclamei resoluto:

- Entremos, pois!

Adentramos aquele estreito e horrível corredor. Corríamos com a velocidade do relâmpago. Em cada uma das portas interiores brilhava com tétrica luz uma inscrição ameaçadora. Quando terminamos de percorre-lo, fomos parar num vasto e tenebroso pátio, em cujo o fundo via-se uma grossa e horrível portinha, como jamais vi igual, e nela estava escrita estas palavras: Ibunt impii in ignem aeternum [Os ímpios irão para o fogo eterno]. Todas as paredes em volta estavam cheias de inscrições. Pedi permissão para o guia para lê-las, e me respondeu:

- A vontade.

- Então examinei tudo. Num lugar, vi escrito: Dabo ignem in carnes eorum ut comburantur in sempiternum [Darei fogo a suas carnes para que queime eternamente]. Cruciabuntur die ac nocte in saecula saeculorum [Serão atormentados dia e noite pelos séculos dos séculos]. Noutro lugar: Hic universitas malorum per omnia saecula saeculorum [Aqui está o conjunto dos moles pelos séculos dos séculos]. E noutro: Nullus est hic ordo, sed horror sempiternus inhabitat [Aqui não há ordem, mas habita horror eterno]. Fumus tormentorum suorum in aeternum ascendit [Eternamente estará subindo o fumo de seus tormentos]. Non est pax impiis [Não há paz para os ímpios]. Clamor et stridor dentium [Clamor e ranger de dentes].

Enquanto eu estava lendo as inscrições a volta, o guia, que havia ficado no meio do pátio, aproximou-se e me disse :

- A partir daqui ninguém mais poderá ter um companheiro que o sustente, um amigo que o conforte, um coração que o ame, um olhar compassivo, uma palavra benévola; passamos a linha. Queres ver ou experimentar?

- Só quero ver - Respondi.

- Vem, então - acrescentou o amigo, e tomou-me pela mão.

Levou-me assim adiante daquela portinha e abriu-a . comunicava com um espaço em cujo fundo havia uma grande cova fechada com uma ampla janela de um só cristal que ia desde o piso até o teto, e através do qual se podia divisar o interior. Dei um passo para trás e retrocedi até o umbral da porta, tomado por indescritível terror.

Apareceu diante de meus olhos uma espécie de imensa caverna que se perdia como que nas entranhas da montanha, cheias de fogo, não comovemos na terra, com chamas vivas, mas um fogo tal e tão ardente que tudo o que havia em torno estava torrado e embranquecido pelo excessivo calor. Paredes, tetos, chão, ferro, pedra, lenha, carvão, tudo estava branco e incandescente. Com certeza o fogo era de milhares e milhares de graus de calor; mas nada se reduzia as cinzas, nada se consumia.

Não sou capaz de descrever aquela caverna em toda a sua espantosa realidade. Praeparata est enim ab hero Thopheth, a rege praeparata, profunda et dilatata. Nutrimentum eius, ignis et ligna multa: flatus Domini sicut torrens sulphuris succendens eam (Isaías, 30, 33) [Desde muito tempo, foi Thopheth preparada por seu dono, foi preparada pelo rei, profunda e larga. Seu alimento é fogo e muita lenha; o sopro do Senhor, como uma torrente de enxofre, a mantém acesa].

Enquanto eu olhava tudo aquilo estarrecido, vejo inesperadamente cair com fúria incoercível um jovem que, lançando um grito lancinante, como o de uma pessoa, que estivesse a ponto de cair num lago de bronze derretido, se precipita no meio do fogo, torna-se incandescente como toda a caverna e fica imóvel, ressoando por uns instantes o eco de sua voz agoniada.

Cheio de horror, fechei os olhos no jovem, e pareceu-me um do oratório, um de meus filhos!

- Mas, não é este um de meus rapazes? - Perguntei ao guia - Não é fulano de tal?

- Sim, é ele - Me respondeu.

- E porque - Acrescentei - Não muda de posição? Como é que esta assim incandescente e não se consome?

- Preferiste ver, por isso agora não me fales. Olha e verás. Ademais, omnis enim igne salietur et omnis victima sale salietur (S. Marcos, 14, 15) [Será salgado com fogo e toda vítima se condimentará com sal].

Mal havia voltado os olhos, quando outro jovem, com furor desesperado e grandíssima velocidade, corre e se precipita na mesma caverna. Também era do oratório. Mal caiu, já não se moveu mais; também ele havia lançado um grito lancinante, e sua voz se havia confundido, com o ultimo eco do grito do que cairá antes.

Chegaram depois outros igualmente precipitados; seu numero aumentava cada vez mais, todos lançavam o mesmo grito e ficavam imóveis incandescentes, como os que os tinham precedido.

Observei que o primeiro teria ficado com a mão no ar e com o pé também suspenso no alto o segundo havia ficado como que dobrado para baixo. Uns tinham os pés no ar; outros, a cara contra o solo; outros, estavam como que suspensos, sustentando-se com um só pé e com uma só mão. Havia os sentados ou estendidos, apoiados de um lado em pé ou de joelhos, com as mãos entre os cabelos. Havia, por fim, um grande número de jovens como estatuas, em posições cada qual mais dolorosa.

Vieram ainda muitos mais aquela fornalha. Jovens que em parte eu conhecia e em parte eram desconhecidos. Lembrei-me então do que está escrito na Bíblia: como se cai pela primeira vez no inferno, assim se estará eternamente. Lignum, in quocumque loco ceciderit, ibi erit [onde cair a árvore, ali ficará].

Aumentava em mim o espanto, e perguntei ao guia:

- Mas esses que ocorrem com tanta velocidade, não sabem que vem ter aqui?

- Oh, sim! Sabem que vão para o fogo! Foram avisado mil vezes, mas correm voluntariamente por causa do pecado, que não detesta e não querem abandonar, porque desprezaram e rechaçaram a misericórdia de Deus que incessantemente os chamava a penitência. Por isso a justiça Divina, provocada, os empurra, os insta, os persegue e não podem parar enquanto não chegam a este lugar.

Qual não deve ser o desespero destes desgraçados sem a menor esperança de sair daqui! - Exclamei. - Queres conhecer as inquietações e os furores das almas deles? Aproxima-te um pouco mais - Respondeu o guia.

Dei alguns passos para a janela, e vi que muitos daqueles miseráveis se golpeava e feriam uns aos outros e se mordiam como cães raivosos; outros se arranhavam o rosto, se laceravam as mãos, despedaçavam as próprias carnes e as atiravam pelo ar com desprezo. De repente, o teto da caverna se tornou transparente, como de cristal, e através dele se via um pedaço do céu e as radiantes figuras de seus companheiros para sempre salvos.

Os condenados bramiam com feroz inveja, porque os justos haviam sido olhados por ele, em certo tempo, como objeto de irrisão. Peccator videbit et irascetur; dentibus suis fremet et tabescet [O pecador verá e se encolerizará a seus dentes rangerão].

- Diz-me - Perguntei a meu guia - Como é que não se ouve nenhuma voz?

- Aproxima-te ainda mais - me gritou.

Aproximei-me do cristal da janela e ouvi que uns rugiam e choravam contorcendo-se; outros blasfemavam e imprecavam os santos. Aquilo tudo era um caos de vozes e gritos autos e confusos, pelo que perguntei ao meu amigo:

Que dizem eles? Que estão gritando?

- Recordando a sorte de seus companheiros bons, vêem-se obrigados a confessar: Nos insensati! Vitam illorum aestimabamus insaniam et finem illorum sine honoré [Nós, insensatos considerávamos uma loucura a vida que levavam, e seu fim sem honra]. Ecce quomodo computati sunt inter filios Dei et inter sanctos sors illorum est. Ergo erravimus a via veritatis [Eis que foram contados no numero dos filhos de Deus e sua sorte juntamente com a dos santos. Nós nos afastamos, pois, do caminho da verdade].

Por isso gritam: Lasati sumus in via iniquitatis et perditionis. Erravimus per vias difficiles, viam autem Domini ignoravimus [Corremos pelo caminho da iniqüidade e da perdição. Perdemo-nos por caminhos difíceis e não conhecemos o caminho do Senhor].

Quid nobis profuit superbia? [De que nos serviu nosso orgulho?]

Transierunt omnia illa tanquam umbra [Tudo passou como uma sombra].

Estes são os lúgubres cantos que ali ressoarão por toda a eternidade. Mas inúteis gritos, inúteis esforços, inútil pranto! Omnis dolor irruet super eos! [Toda a dor cairá sobre eles]. Aqui já não há tempo, há só eternidade.

Enquanto contemplava, cheio de horror, o estado de muitos de meus jovens, assaltou-me imprevistamente uma idéia:

- Mas como é possível que os que se encontram aqui estejam todos condenados? Estes jovens estavam ontem à tarde vivos no Oratório.

O amigo me disse: - Os que aqui vês vivem, mas estão mortos para a graça de Deus, e se morressem agora ou continuassem procedendo como no presente, se condenariam. Mas não percamos tempo; sigamos adiante.

E me afastou daquele lugar, e por um corredor que baixava a um profundo subterrâneo me conduziu a outro em cuja entrada estava escrito:

Vermis eorum non moritur, et ignis non extinguitur... Dabit Dominus omnipotens ignem et vermes in carnes eorum, ut urantur et sentiant usque in sempiternum (Judite 16, 21) [ Seu verme não morrerá e o fogo não se extinguirá... O Senhor onipotente dará fogo e vermes a suas carnes para que ardam e sofram eternamente].

Ali se contemplava o espetáculo dos atrozes remorsos dos que foram educados em nossas casas.

A recordação de todos e de cada um dos pecados não perdoados e sua justa condenação! A de terem tido mil remédios até mesmo extraordinários para se converterem ao Senhor, para serem perseverantes no bem, para ganharem o paraíso! A recordação de tantas graças prometidas, oferecidas e dadas por Maria Santíssima e não correspondidas! Terem podido se salvar com tão pouco esforço e perderem-se irremissivelmente para sempre! Lembrarem de tantos bons propósitos feitos e não compridos! Ah! Bem diz o provérbio que o inferno está cheia de boas intenções não realizadas!

Ali voltei a ver todos os jovens do oratório que havia visto pouco antes naquele forno (Alguns dos quais me estão ouvindo neste momento; outros já estiveram conosco, outros eu não conhecia). Aproximei-me e observei que todos estavam cheios de vermes e animais asquerosos que lhes roíam e consumiam o coração, os olhos, as mãos, as pernas, os braços, de maneira tão miserável que nem sei exprimir com palavras. Estavam imóveis, expostos a toda espécie de moléstias, e não podiam defender-se de modo algum.

Aproximei-me ainda mais para que me vissem esperando poder falar-lhes para que me dissessem algo, mas nenhum falava e nem me olhava. Perguntei então ao guia a causa disso, e me foi respondido que no outro mundo os condenados não tem liberdade. Cada um sofre ali todo o castigo que Deus lhe impôs, sem que possa haver mutação de espécie alguma.

- Agora é preciso - Acrescentou - que também tu vás ao meio daquela região de fogo que viste.

- Não, não! - Respondi aterrorizado - Para ir ao inferno é preciso ser antes julgado; eu ainda não o fui. Não quero, pois, ir ao inferno.

- Diz-me - observou o amigo - o que te parece melhor; ir ao inferno e livrar teus jovens, ou ficares fora e deixa-los no meio de tantos tormentos?

- Atordoados diante desta proposta, respondi:

- Oh! Quero muito a meus caros jovens, quero que todos se salvem. Mas não poderíamos fazer de tal forma que nem eles nem eu entremos ai?

- Ainda estas em tempo - me respondeu o amigo - e também eles estão, desde que faças tudo o que podes.

Meu coração se dilatou e eu disse para mim mesmo:

- Pouco me importa sofrer, desde que possa livrar dos tormentos estes meus queridos filhos.

- Vem, pois, dentro - prosseguiu o amigo. E vê a bondade e a onipotência de Deus, que amorosamente emprega mil meios de chamar a penitência teus jovens e salva-lo da morte eterna.

Tomou-me pela mão para introduzir-me na caverna, mal pus os pés no umbral encontrei inesperadamente transportado para uma magnífica sala com porta de cristal. Sobre estas, a regular distancias pendiam largos véus que cobriam outros tantos departamentos que comunicavam com a caverna.

O guia me indicou um dos véus, sobre o qual estava escrito "Sexto Mandamento", e exclamou:

- A transgressão desse Mandamento é a causa da ruína eterna de muitos jovens.

- Mas não se confessaram?

- Sim, confessaram-se, mas os pecados contra a bela virtude, confessaram-nos mal ou calaram-nos por completo. Por exemplo, um que havia cometido quatro ou cinco desses pecados, confessou somente dois ou três. Há quem tenha cometido um só na meninice e sempre teve vergonha de confessa-lo, ou o confessou mal, ou não disse tudo. Outros não tiveram arrependimento nem propósito. Mais ainda: alguns, em vez de examinar sua consciência, estudavam o modo de enganar o confessor. E o que morre com tal resolução está disposto a ser do número de condenados, e assim será para toda a eternidade. Só os que, arrependidos de todo o coração, morrem com a esperança da eterna salvação, esses serão eternamente felizes. E agora queres ver por que a misericórdia de Deus te conduziu até aqui?

Levantei o véu e vi um grupo de meninos do Oratório, todos meu conhecidos, condenados por esse pecado. Entre eles havia alguns que, na aparência, têm boa conduta.

- Pelo menos agora me deixarás escrever os nomes desses meninos para poder adverti-los em particular.

- Não é preciso - me respondeu.

- Que devo então dizer a eles?

- Prega por toda a parte contra a impureza. Basta avisa-los em geral, e não te esqueças de que, ainda que os avises em particular, prometerão, mas nem sempre com firmeza. Para conseguir isso se requer a graça de Deus, a qual, se pedida, jamais faltará a teus jovens. O bom Deus manifesta especialmente seu poder em Se compadecer e perdoar. Oração, pois, e sacrifício de tua parte. Quanto aos jovens, que ouçam tuas exortações, interroguem suas consciências, e ela lhes sugerirá o que devem fazer.

Estivemos então conversando cerca de meia hora sobre as condições necessárias para fazer uma boa confissão. Depois o guia repetiu várias vezes, erguendo a voz:

- Avertere!... Avertere!...

- Que significa essa exclamação?

- Mudar de vida, mudar de vida!...

Todo confuso por aquela revelação, baixei a cabeça e estava a ponto de me retirar, quando o guia me chamou dizendo:

- Ainda não viste tudo.

E dirigindo-se a outra parte, levantou outro véu, sobre o qual estava escrito: Qui volunt divites fieri, incident in tentationem et laqueum diaboli [Os que querem ficar ricos, caem na tentação e no laço do demônio].

Li e exclamei:

- Isso não diz respeito aos meus jovens, porque são pobres como eu; não somos ricos nem pretendemos sê-lo. Nem sequer o imaginamos.

Removido o véu, apareceram no fundo alguns meninos, todos meus conhecidos, que sofriam como os anteriores, e, mostrando-os, me disse:

- Acho que é bem a teus meninos que essa inscrição diz respeito!

- Explica-me, pois, o porquê da palavra divites [ricos].

- Por exemplo, alguns dos teus jovens têm o coração de tal maneira apegado a algum objeto material, que esse afeto os afasta do amor de Deus, e por isso faltam com caridade, a piedade, a mansidão. Não somente com o uso das riquezas se perverte o coração, mas também com o desejo delas, sobretudo se esse desejo ofende a justiça. Teus jovens são pobres, mas repara que a gula e o ócio são péssimos conselheiros. Há alguns que em seus lugares de origem se tornaram culpados de furtos significativos e, podendo, não penso em restituir. Há quem estuda a maneira de abrir com chaves falsas a dispensa; quem procura entrar no escritório do prefeito ou do ecônomo da casa; quem vai remexer as malas dos companheiros para roubar-lhes comestíveis, dinheiro ou livros para seu uso...

De uns e de outros me disse os nomes, e prosseguiu:

- Alguns se encontram aqui por se terem apropriado de objetos do vestuário, roupa branca, cobertores e colchas que pertenciam à rouparia do Oratório, para envia-los a suas casas. Alguns, por terem causado voluntariamente danos graves e não os terem reparado. Outros, por não terem devolvido coisas que lhes haviam sido emprestadas; e alguns por terem retido somas de dinheiro que lhes haviam sido confiadas para que as entregassem ao superior. E concluiu dizendo:

- Já que tais pessoas te foram indicadas, avisa-as; diz-lhes que rejeitem todos os desejos inúteis e nocivos, que sejam obedientes à lei de Deus e zelosos de sua honra; se não forem assim, a cobiça os arrastará a excessos piores que os submergirão nas dores, na morte, na perdição.

Eu não conseguia entender como, para certas coisas considerdas insignificantes pelos nossos jovens, haviam sido preparados castigos tão horríveis. Mas o amigo cortou minhas reflexões, dizendo:

- Recorda o que te foi dito diante do espetáculo dos cachos estragados da videira.

E levantou outro véu, que ocultava muitos de nossos jovens, os quais logo reconheci, pois estão presentemente no Oratório. Sobre o véu estava escrito: Radix omnium malorum [Raiz de todos os males]. E logo me perguntou:

- Sabes o que significa isso? Sabes qual é o pecado indicado por essa epígrafe?

- Parece-me que só pode ser o do orgulho.

- Não - respondeu.

- Mas sempre ouvi dizer que o orgulho é a raiz de todo o pecado.

- Sim, genericamente é; mas, em concreto, sabes qual foi o pecado que fez cair Adão e Eva no primeiro pecado, em conseqüência do qual foram expulsos do Paraíso terrestre?

- A desobediência.

- Precisamente; a desobediência é a raiz de todo o mal.

- E que devo dizer a meus jovens sobre esse ponto?

- Presta atenção: os jovens que tu vês aqui são os desobedientes, que vão preparando para si próprios tão lamentável fim. Esses tais e outros que tu crês que foram descansar, à noite descem a passear no pátio; não fazendo caso das proibições, vão a lugares perigosos, trepam nos andaimes de obras em construção, pondo em risco até a própria vida. Alguns, apesar das prescrições do regulamento, na igreja não estão como devem; em vez de rezarem, pensam em coisas completamente diversas, constroem na sua mente castelos no ar. Outros perturbam os companheiros. Há os que procuram posturas cômodas e dormem durante as sagradas funções. Outros, tu crês que vão à igreja e no entanto não vão. Ai do que descuida a oração! Quem não reza se condena! Alguns estão aqui porque, em vez de cantar os cânticos sagrados ou o ofício da Santíssima Virgem, lêem livros que tratam de tudo menos de religião, e alguns - o que é muito vergonhoso! - chegam a ler livros proibidos.

E continuou enumerando várias outras transgressões que são causa de graves desordens. Quando terminou, comovido olhei o guia na face; ele também me fitou, e eu lhe disse:

- E todas essas coisas, poderei contá-las a meus jovens?

- Sim, podes dizer a todos eles aquilo de que te recordares.

- E que conselho poderei dar-lhes para que não lhes sucedam tão graves desgraças?

- Insistirás demonstrando como a obediência, mesmo nas menores coisas, a Deus, á Igreja, aos pais e aos superiores, os salvará.

- E que mais?

- Dirás a teus jovens que evitem muito o ócio, porque essa foi a causa do pecado de Davi. Diz-lhes que estejam sempre ocupados, porque assim o demônio não terá tempo de assalta-los.

Inclinei a cabeça e prometi. Não mais suportando aquele terror, disse o amigo:

- Agradeço-te a caridade que tiveste comigo, mas rogo-te que me faças sair daqui.

- Vem comigo - disse-me então - e, encorajando-me, tomou-me pela mão e sustentou-me, porque eu me sentia extenuado e sem forças. Uma vez saídos da sala, atravessamos rapidamente o horrível pátio e o largo corredor de entrada; antes de atravessar o umbral da última porta de bronze, mais uma vez voltou-se para mim e exclamou:

- Agora que viste os tormentos dos outros, é preciso que tu também experimentes um pouco o Inferno.

- Não! Não! - gritei horrorizado.

Ele insistia e eu recusava sempre.

- Não temas - dizia-me - é só para experimentar; toca nessa muralha.

Eu não tinha coragem e queria afastar-me; mas ele me segurou, dizendo-me:

- No entanto, é necessário que experimentes!

E me agarrou resolutamente pelo braço e me levou para junto da muralha, dizendo:

- Toca rapidamente uma vez só, para que possas dizer que estiveste visitando as muralhas dos suplícios eternos e as tocaste; e também para que compreendas como será a última muralha, se a primeira já é tão terrível. Vês esta muralha?

Observei-a com mais atenção; era de colossal espessura. O guia prosseguiu:

- Esta é a milésima parede antes de chegar ao verdadeiro fogo do inferno. Mil muralhas o rodeiam. Cada uma delas tem mil medidas de espessura, e essa é a distância entre cada uma delas; cada medida é de mil milhas; esta muralha dista, pois, um milhão de milhas do verdadeiro fogo do Inferno e, portanto, é um pequeníssimo princípio do mesmo Inferno.

Dito isso, e vendo que eu me encolhia para não tocar a muralha, agarrou minha mão, abriu-a com força e fez com que eu a encostasse na pedra daquela milésima muralha. Naquele instante senti uma queimadura tão intensa e dolorosa que, saltando para trás e dando um fortíssimo grito, acordei.

Encontrei-me sentado na cama, e sentindo que a mão ardia, esfregava-a na outra mão para fazer cessar aquela sensação. Quando amanheceu, observei que a mão estava realmente inchada; e a impressão imaginária daquele fogo foi tão forte que pouco depois a pele da palma da mão se desprendeu e mudou.

Tende em consideração que não vos contei estas coisas com todo o seu horror tal como as vi, e com a impressão que me fizeram, para não vos assustar demais. Sabemos que o Senhor nunca falou do inferno a não ser por figuras, porque, ainda quando no-lo houvesse descrito como é, não o teríamos entendido. Nenhum mortal pode compreender essas coisas. O Senhor as conhece e pode dize-las a quem quiser.

Várias noites sucessivas tive tal perturbação, que não pude dormir por causa do medo.

Contei-vos brevemente o que vi em sonhos muito longos; deles não vos fiz senão um breve resumo. Darei mais tarde instruções sobre o respeito humano, sobre o sexto e o sétimo Mandamentos, sobre o orgulho. Não farei mais do que explicar esses sonhos; porque em tudo estão conformes com a Sagrada Escritura; ainda mais, não são senão um comentário do que se lê sobre o tema na mesma Escritura.

Nestas noites, já vos contei algumas coisas, mas quando puder vir falar-vos contar-vos-ei as restantes, dando- vos as respectivas explicações.

O Inferno segundo Santa Teresa D' Àvila

1. Havia muito tempo que o Senhor me fazia muitas graças, já referidas, e outras ainda maiores, quando um dia, estando em oração, achei-me subitamente, ao que me parecia, metida de corpo e alma no Inferno.

Entendi que o Senhor queria fazer-me ver o lugar que os demónios aí me haviam preparado, e eu merecera por meus pecados.

Durou brevíssimo tempo; contudo, ainda que vivesse muitos anos, acho impossível esquecê-lo.

A entrada pareceu-me um túnel longo e estreito, semelhante a um forno muito baixo, escuro e apertado.

O chão tinha aparência de lama, ou antes, de lodo sujíssimo e de odor pestilencial, cheio de répteis venenosos.

No fundo, havia uma concavidade aberta na parede, como um armário, onde me vi encerrada de maneira muito apertada.

2. O tormento interior é tal, que não há palavras para o definir, nem se entende como é realmente.

Na alma, senti tal fogo, que não tenho capacidade para o descrever.

No corpo, eram incomparáveis as dores!

Tenho passado nesta vida dores gravíssimas, e, no dizer dos médicos, são as maiores que se podem suportar; como, por exemplo, quando se encolheram todos os meus nervos, ao ponto de ficar tolhida.

Já não falo doutras muitas dores de diversos géneros, e até algumas causadas (directamente) pelo Demónio.

No entanto, posso afirmar que tudo isso foi nada, em comparação do que ali experimentei.

E o pior era saber que isto seria sem fim, sem jamais cessar!

Sim, repito, tudo o mais pode chamar-se nada, em relação ao agonizar da alma:

É um aperto, um afogamento, uma aflição tão intensa, e acompanhada duma tristeza tão desesperada e pungente, que não sei como posso explicar semelhante estado!

Compará-lo à sensação de que nos estão sempre a arrancar a alma, é pouco, pois, em tal caso, seria como se alguém nos acabasse com a vida.

Aqui (no Inferno), é a própria alma que se despedaça.

O facto é que não sei como descrever aquele fogo interior e aquele desespero, que se sobrepõem a tão grandes tormentos!

Eu não via quem os provocava, mas sentia-me queimar e retalhar.

Piores, repito, são aquele fogo e aquele desespero que me consumiam interiormente!

Em lugar tão pestilencial, sem esperar consolo, é impossível sentar-se, ou deitar-se, nem há espaço para tal.

Puseram-me numa espécie de fenda cavada na muralha.

As próprias paredes, espantosas à vista, oprimem, e tudo ali sufoca.

Por toda a parte, trevas escuríssimas; não há luz.

Não entendo como, sem claridade, se enxerga tudo, causando dor nos olhos...

Nesta ocasião, o Senhor não quis que eu visse mais de tudo aquilo que há no Inferno.

3. Noutra visão, vi coisas horripilantes acerca do castigo de alguns vícios. Pareceram-me muito mais horrorosas à vista!

Como não sentia tais penas, não me causaram tanto temor como na primeira visão, na qual o Senhor quis que eu verdadeiramente sentisse aquelas torturas e aquela aflição de espírito, como se o corpo as estivesse padecendo.

Como foi isso, não sei, mas bem entendi ser grande graça do Senhor querer que eu visse, com os meus olhos, aquilo que a Sua Misericórdia me havia livrado.

Verdadeiramente, é nada ouvir discorrer, ou ainda meditar, sobre a diversidade dos tormentos, como eu doutras vezes havia feito, embora raramente.

A feição da minha alma não é ser levada pelo temor.

Lia que os demónios atenazam as almas e lhes infligem outros suplícios.

Tudo isso é nada, comparado com as verdadeiras penas, que são muito diferentes.

Numa palavra, são tão diferentes (para pior) quanto o esboço é diferente da realidade.

Queimar-se aqui na Terra é sofrimento muito leve, em comparação com aquele fogo do Inferno.

4. Fiquei tão aterrorizada, e ainda agora o estou enquanto escrevo, apesar de terem decorrido já quase seis anos!

De tanto temor, tenho a impressão de ficar gelada.

Desde então, ao que me recordo, cada vez que tenho sofrimentos ou dores, tudo o que se pode passar na Terra me parece nada.

Penso que, em parte, nos queixamos sem motivo.

Foi esta, repito, uma das maiores graças que o Senhor me fez.

Valeu-me imensamente, quer para perder o medo quanto às tribulações e contradições desta vida, quer para me esforçar a padecê-las, e para dar graças ao Senhor por me ter livrado, ao que agora me parece, de males tão perpétuos e terríveis!

domingo, 15 de novembro de 2009

O PRIMEIRO CULTO PROTESTANTE NO BRASIL

Cabe aos presbiterianos a honra de terem realizado o primeiro culto evangélico na história do Brasil e das Américas. Esse evento singular ocorreu há 450 anos em uma pequena colônia fundada pelos franceses na baía de Guanabara.



1. A França Antártica



Após o descobrimento do Brasil, Portugal demorou a interessar-se pela ocupação e a colonização dos novos domínios. Com isso, a colônia atraiu a atenção de outras nações européias, especialmente a França. Após a experiência mal-sucedida das capitanias hereditárias e as constantes incursões estrangeiras, Portugal resolveu tomar providências concretas. Em 1549 enviou o primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de Souza, que se instalou em Salvador. Todavia, o controle da imensa costa era ainda muito limitado. Foi nesse contexto que o militar e aventureiro Nicolas Durand de Villegaignon teve a idéia de fundar uma colônia numa região bem conhecida dos franceses: a baía de Guanabara.



Villegaignon aproximou-se do vice-almirante Gaspard de Coligny, um dos principais conselheiros do reino, que nutria fortes simpatias pela Reforma. Com isso, conseguiu o apoio do rei Henrique II (1547-1559), que lhe forneceu dois navios aparelhados e recursos para a viagem. A expedição chegou à Guanabara no dia 10 de novembro de 1555, sendo bem recebida pelos índios tupinambás, acostumados à presença de franceses na região. O grupo instalou-se na pequena ilha de Serigipe, mais tarde denominada Villegaignon, onde foi construído o Forte Coligny.



2. A vinda dos reformados



Diante de várias dificuldades surgidas, Villegaignon escreveu à Igreja Reformada de Genebra solicitando o envio de pastores e colonos evangélicos que contribuíssem para a elevação do nível moral e espiritual da colônia. Coligny convidou para liderar o grupo um ex-vizinho seu, Filipe de Corguilleray, conhecido como senhor Du Pont. Por sua vez, João Calvino e seus colegas alegremente escolheram para acompanhar os colonos os pastores Pierre Richier (50 anos) e Guillaume Chartier (30 anos). Os seus objetivos específicos eram implantar a fé reformada entre os franceses e evangelizar os indígenas.



Os huguenotes que os acompanharam foram Pierre Bourdon, Matthieu Verneil, Jean du Bourdel, André Lafon, Nicolas Denis, Jean Gardien, Martin David, Nicolas Raviquet, Nicolas Carmeau, Jacques Rousseau e o sapateiro Jean de Léry, o cronista da viagem, que escreveria a obra Viagem à Terra do Brasil (publicada em 1578). Eram ao todo 14 pessoas. O grupo deixou Genebra em 16 de setembro de 1556. Após visitarem o almirante Coligny, seguiram para Paris, onde outros se uniram à comitiva. Alguns pensam que entre eles estava Jacques Le Balleur. No dia 19 de novembro embarcaram para o Brasil no porto de Honfleur, na Normandia.



A frota de três navios, comandada por Bois Le Conte, sobrinho de Villegaignon, levava cerca de 290 pessoas, inclusive algumas mulheres. Como de costume, a viagem foi muito penosa. A certa altura, diante da situação em que se achavam, os reformados recitaram o Salmo 107 (ver os vv. 23-30). No dia 7 de março de 1557, os viajantes finalmente entraram no “braço de mar” chamado Guanabara pelos selvagens e Rio de Janeiro pelos portugueses.



3. O primeiro culto



O desembarque no forte Coligny deu-se no dia 10 de março, uma quarta-feira. O vice-almirante recebeu o grupo afetuosamente e demonstrou alegria porque vinham estabelecer uma igreja reformada. Logo em seguida, reunidos todos em uma pequena sala no centro da ilha, foi realizado um culto de ação de graças, o primeiro culto protestante ocorrido nas Américas, o Novo Mundo.



O ministro Richier orou invocando a Deus. Em seguida foi cantado em uníssono, segundo o costume de Genebra, o Salmo 5: “Dá ouvidos, Senhor, às minhas palavras”. Esse hino constava do Saltério Huguenote, com metrificação de Clement Marot e melodia de Louis Bourgeois, e até hoje se mantém nos hinários franceses. Bourgeois foi diretor de música da Igreja de Genebra de 1545 a 1557 e um dos grandes mestres da música francesa no século 16. A versão mais conhecida em português (“À minha voz, ó Deus, atende”) tem música de Claude Goudimel (†1572) e metrificação do Rev. Manoel da Silveira Porto Filho.



Em seguida, o pastor Richier pregou um sermão com base no Salmo 27:4: “Uma coisa peço ao Senhor e a buscarei: que eu possa morar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do Senhor e meditar no seu templo”. Após o culto, os huguenotes tiveram sua primeira refeição brasileira: farinha de mandioca, peixe moqueado e raízes assadas no borralho. Dormiram em redes, à maneira indígena. A Santa Ceia segundo o rito reformado foi celebrada pela primeira vez no domingo 21 de março de 1557.



4. Eventos posteriores



Infelizmente, o vice-almirante acabou entrando em conflito com os huguenotes sobre questões doutrinárias e os expulsou da colônia. Em 4 de janeiro de 1558, eles partiram para a França a bordo de um velho navio. O comandante avisou que a viagem iria ser difícil e não haveria alimento para todos. Diante disso, cinco huguenotes se ofereceram para voltar à terra. Inicialmente Villegaignon os recebeu de modo cordial, mas logo os acusou de serem traidores e espiões. Formulou um questionário sobre pontos doutrinários e lhes deu doze horas para responderem por escrito. O resultado foi a bela Confissão de Fé da Guanabara ou Confissão Fluminense.



O almirante declarou heréticos vários artigos e decidiu pela morte dos reformados. No dia 9 de fevereiro de 1558, Jean du Bourdel, Matthieu Verneil e Pierre Bourdon foram estrangulados e lançados ao mar. André Lafon foi poupado devido às suas vacilações religiosas e ao fato de ser o único alfaiate da colônia. Jacques Le Balleur fugiu e foi para São Vicente. Levado preso para a Bahia, ficou encarcerado por oito anos, sendo então conduzido ao Rio de Janeiro, onde foi enforcado. Ele e seus companheiros ficaram conhecidos como os mártires calvinistas do Brasil.



Essa efêmera presença calvinista no início da história do Brasil não produziu efeitos permanentes. Não foi possível aos reformados alcançar seus dois intentos principais: criar uma igreja reformada e evangelizar os nativos. Todavia, esse episódio é considerado um marco significativo na história das missões cristãs, pois foi a primeira vez que os protestantes buscaram anunciar a sua fé a um povo pagão. O fruto mais duradouro do singelo empreendimento foi a bela confissão de fé selada com sangue.

Texto de: Alderi Souza de Matos
Fonte: Instituto Presbiteriano Mackenzie

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Será mesmo que Deus ama e deseja a salvação de todos?

Heitor Alves

Se fizermos esta pergunta para todos o evangélicos, a maioria esmagadora responderiam afirmativamente. São vários os motivos para se responder positivamente a pergunta. Existe um sentimento de que o homem é bom e que não merece ser castigado. O interessante é que querem que Deus sinta este mesmo sentimento quando o assunto é condenação. Deus não pode condenar o homem e nem quer fazer isso. O homem tem valor. Ele é bom, não é tão mal a ponto de merecer o inferno.

Este sentimento tem penetrado nas igrejas evangélicas, distorcendo a teologia bíblica. A teologia predominante nos púlpitos é uma teologia humanista, uma teologia agradável ao homem. Se ouve, domingo após domingo, assuntos relacionados ao existencialismo, onde colocam Deus como um super-herói preparado para enfrentar as dificuldades que o homem venha a sofrer. Se Deus procura "evitar" que o homem sofra nesta vida, muito mais Ele fará na alma do homem. Por isso, vemos aquela doutrina satânica de que Deus deseja e quer a salvação de todos os homens!

Esse é o resultado prático de um cristianismo que jogou no lixo as Sagradas Escrituras. Estão pisando na Palavra de Deus. Rasgando suas páginas e jogando-as nas fogueiras de uma "inquisição" construída para não abalar a credibilidade e não desvalorizar o homem. E de que modo é praticada esta moderna "inquisição"? Não é mais com fogueiras literais ou confisco de bens, ou até mesmo de perda da liberdade. Mas esta moderna forma de "inquisição" é praticada quando é negada a autoridade absoluta e suprema das Escrituras sobre a igreja, e se busca novas revelações extrabíblicas, tratando-as como suprema autoridade.

Por isso encontramos uma grande hostilidade quando vamos expor o que de fato as Escrituras afirmam sobre os assuntos abandonados pelos evangélicos atuais, dentre eles o assuntos sobre a expiação limitada.

Deixando de lado todas as emoções ou humanismo, vamos expor aquilo que a Bíblia fala a respeito do desejo de Deus com respeito a salvação do homem. Afinal de contas, Deus quer a salvação de toda a humanidade?

Todos os arminianos, sem exceção, ao começarem uma discussão a respeito do amor de Deus, lembram logo de João 3.16. “Deus amou o mundo”! Todos são alvos do amor de Deus! É injusto lembrarmos apenas do verso 16. Por que não citar até o verso 21?

16 Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para
que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.

17
Porquanto Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que julgasse o mundo, mas
para que o mundo fosse salvo por ele.

18 Quem nele crê não é julgado; o
que não crê já está julgado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de
Deus.

19 O julgamento é este: que a luz veio ao mundo, e os homens
amaram mais as trevas do que a luz; porque as suas obras eram más.

20
Pois todo aquele que pratica o mal aborrece a luz e não se chega para a luz, a
fim de não serem argüidas as suas obras.

21 Quem pratica a verdade
aproxima-se da luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque feitas
em Deus.

O texto não diz que Deus ama todos os homens. Jesus está dizendo que o amor de Deus não se estende apenas aos judeus de sua época, mas o seu amor alcança pessoas além dos limites da Judéia. O seu amor se estende também aos gentios. Interessante que os arminianos não conseguem enxergar que o alvo do amor de Deus são aqueles que crêem em Jesus Cristo, e somente eles. Veja que o verso 18 decreta a condenação daqueles que não crêem "porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus". Deus não pode amar aquele que se mantém rebelde contra Jesus. O amor de Deus não está nele, e sim a sua ira: "Por isso, quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se mantém rebelde contra o Filho não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus" (Jo 3.36).

O curioso do ensinamento arminiano é que a teologia arminiana diz uma coisa e a bíblia diz outra. Por exemplo: se Deus ama a todos indiscriminadamente (como afirmam os arminianos) a lógica é Cristo orar e desejar a salvação de todos! Mas ele não deseja isso. Podemos notar isso na oração que ele faz em João 17. Cristo ora para que Deus conceda a vida eterna para um grupo seleto de pessoas: "Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. Agora, eles reconhecem que todas as coisas que me tens dado provêm de ti; porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste, e eles as receberam, e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste" (Jo 17.6-8). Em seguida, Cristo fulmina os arminianos com as seguintes palavras: "É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus" (v.9). Por todo o capítulo 17, Cristo repete sempre as mesmas palavras "aqueles que tu me deste", "homens que me deste do mundo".

Eu não posso acreditar que há um desentendimento entre o Pai e o Filho. Não posso acreditar numa confusão na Trindade! Deus desejando salvar a todos, mas o Filho orando por alguns. O próprio Jesus afirmou que Ele veio fazer a vontade do Pai, esta é a sua comida (Jo 4.34). Deus não ama a todos e não quer a salvação de todos!

Para encerrar, tenho mais uma prova de que Deus não deseja a salvação de todos. A prova está em Mateus 11.20-24.

20 Passou, então, Jesus a increpar as cidades nas quais ele operara numerosos
milagres, pelo fato de não se terem arrependido:

21 Ai de ti, Corazim!
Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os
milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido com pano
de saco e cinza.

22 E, contudo, vos digo: no Dia do Juízo, haverá menos
rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras.

23 Tu, Cafarnaum,
elevar-te-ás, porventura, até ao céu? Descerás até ao inferno; porque, se em
Sodoma se tivessem operado os milagres que em ti se fizeram, teria ela
permanecido até ao dia de hoje.

24 Digo-vos, porém, que menos rigor
haverá, no Dia do Juízo, para com a terra de Sodoma do que para contigo.


Cristo passa a condenar as cidades que tiveram a oportunidade de presenciar a pregação do evangelho (que naquela época era acompanhada da operação de milagres que testificavam da pregação). Corazim, Betsaida e Cafarnaum foram as cidades onde Cristo pregou o evangelho e mesmo assim estas cidades não se converteram. A partir daí, Cristo nos revela algo que nos incomoda: ele começa a “passar na cara” destas cidades que se ele tivesse pregado (e operado milagres) nas cidades de Tiro, Sidom e Sodoma, elas teriam se arrependido “com pano de saco e cinza” e permanecido “até ao dia de hoje”.

Se Cristo sabia que essas cidades iriam se arrepender com sua pregação, então, porque ele não foi até elas? Porque Cristo abriu mão dessas cidades, sabendo que os seus habitantes seriam convertidos e ingressados no reino dos céus? Deus não ama a todos? Então porque Deus deixou de fora dos céus os homens, as mulheres, os idosos, as crianças, os jovens e os adolescentes de Tiro, Sidom e Sodoma? Não foi o próprio Jesus quem afirmou: “Eu vos afirmo que, de igual modo, há júbilo diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende” (Lucas 15:10)? Porque Deus evitaria causar uma grande festa no céu por ocasião de três cidades arrependidas? Deus não ama a todos?

Isso me faz lembrar um outro texto: Isaías 6.9-13:

9 Então, disse ele: Vai e dize a este povo: Ouvi, ouvi e não entendais;
vede, vede, mas não percebais.

10 Torna insensível o coração deste povo,
endurece-lhe os ouvidos e fecha-lhe os olhos, para que não venha ele a ver com
os olhos, a ouvir com os ouvidos e a entender com o coração, e se converta, e
seja salvo.

11 Então, disse eu: até quando, Senhor? Ele respondeu: Até
que sejam desoladas as cidades e fiquem sem habitantes, as casas fiquem sem
moradores, e a terra seja de todo assolada,

12 e o SENHOR afaste dela os
homens, e no meio da terra seja grande o desamparo.

13 Mas, se ainda
ficar a décima parte dela, tornará a ser destruída. Como terebinto e como
carvalho, dos quais, depois de derribados, ainda fica o toco, assim a santa
semente é o seu toco.

Deus envia Isaías para pregar a um povo que não se arrependerá. Não se arrependerá porque Deus tornará insensível o coração desse povo. Não se arrependerá porque Deus endurecerá os ouvidos. Não se arrependerá porque fechará os olhos, para que não venha ele a ver com os olhos, a ouvir com os ouvidos e a entender com o coração, e se converta, e seja salvo”.

Somente os eleitos de Deus são os alvos do amor salvífico de Deus. Somente os seus eleitos experimentarão a graça de serem participantes do seu reino.

Não cabe a nós imaginarmos quem é o alvo do amor de Deus e quem não é. Não temos esse poder. Não podemos deixar de pregar o evangelho a alguém achando que esse alguém não faça parte dos eleitos. Resta-nos pregar o evangelho ao máximo de pessoas possíveis, sem fazer distinção. Precisamos olhar para as pessoas como um “eleito” em potencial. Todos os homens são passíveis de receberem a Cristo de bom grado e de coração. Por isso precisamos pregar o evangelho a toda criatura. A pregação do evangelho a todos não garante salvação. Precisamos ser o agricultor que joga as sementes em vários tipos de solos; mas isso não garante que todos os solos receberão as sementes e se transformarão em belas plantas e árvores. Deus mesmo fará com que as sementes da Sua palavra caia em corações que Ele mesmo preparou para recebê-las.

Devemos cumprir com nossa obrigação de pregar o evangelho a todos. Inclusive aos nossos parentes. Não sabemos o que Deus planejou para a vida de cada um deles. Não sei o destino eterno da minha esposa, do meu filho, do meu marido, do meu irmão, do meu pai, da minha mãe... Não cabe a mim fazer conjecturas. Cabe a mim pregar o evangelho e orar a Deus e entregar a alma do meu parente nas mãos de Deus.

O próprio Espírito de Deus acalmará nossa ansiedade, acalmará nosso espírito, se estivermos com dúvidas a respeito daquele parente que faleceu. Por mais que seja triste e dolorosa a partida de um ente querido que morreu sem Cristo, Deus mesmo nos dará o consolo necessário e suficiente para nossa dor. A nossa postura diante de Deus deve ser uma postura de honra, louvor, adoração, de submissão, de entrega total de nossas vidas a Ele, reconhecendo que Ele pode fazer o que bem entender com suas criaturas.

Soli Deo Gloria!

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A Igreja católica (São Cirilo de Jerusalém)

São Cirilo de Jerusalém - Século IV

Católica ou universal chama-se a Igreja, porque se espalhou de um extremo a outro de todo o orbe da terra. Porque ensina universalmente e sem falha todos os artigos da fé que os homens precisam conhecer, seja sobre as coisas visíveis ou as invisíveis, seja as celestes ou as terrestres. Porque reúne no verdadeiro culto o gênero humano inteiro, autoridades ou súditos, doutos ou ignorantes. Enfim, porque cura e sana em todo o universo qualquer espécie de pecados cometidos pela alma e pelo corpo. Porque ela possui tudo, toda virtude, seja qual for o nome que se lhe dê, nas ações e nas palavras, bem como toda a variedade dos dons espirituais.


Igreja, isto é, convocação: nome bem apropriado porque convoca a todos e os reúne,como o Senhor diz no Levítico: Convoca toda a congregação (= Igreja) diante da porta do tabernáculo do testemunho. É de notar a palavra convocar, usada aqui pela primeira vez nas Escrituras, na ocasião em que o Senhor estabeleceu Aarão como sumo sacerdote. No Deuteronômio Deus diz a Moisés: convoca para junto de mim o povo para que me escutem e aprendam a temer-me. Há outra menção da Eclésia (= convocação), quando se fala das tábuas da Lei: Nelas estavam escritas todas as palavras que o Senhor vos falou no monte, do meio do fogo, no dia da Eclésia, isto é, convocação; como se dissesse mais claramente: No dia em que, chamados pelo Senhor, vos congregastes. O Salmista também diz: eu te confessarei, Senhor, na grande Eclésia, no meio do povo numeroso te louvarei.

Já antes o salmista cantara: Na Eclésia, bendizei o Senhor Deus, das fontes de Israel. O Salvador edificou com os gentios a segunda, a nossa Santa Igreja dos cristãos, da qual dissera a Pedro: E sobre esta pedra edificarei e minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.

Rejeitada a primeira, a da Judéia, de ora em diante multiplicam-se as Igrejas de Cristo[3], aquelas de que se fala nos salmos: Cantai ao Senhor um cântico novo, seu louvor na Eclésia dos santos. De acordo com isto diz o Profeta aos judeus: Meu afeto não está em vós, diz o Senhor, e acrescenta logo: Por isso, do nascer do sol até o ocaso, meu nome é glorificado entre os povos. Desta mesma santa e católica Igreja escreve Paulo a Timóteo: Para que saibas como comportar-te na casa de Deus, a Igreja do Deus vivo, coluna e sustentáculo da verdade.

Igreja “católica” é o nome próprio desta santa Mãe de todos nós. É também a Esposa de nosso Senhor Jesus Cristo, o unigênito Filho de Deus. Com efeito, está escrito: Assim como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela, e o que segue. Ela também manifesta em si a figura e a imitação da Jerusalém do alto, que é livre e mãe de todos nós. Sendo antes estéril é agora mãe de numerosa prole.

Repudiada a primeira, na segunda, isto é, na Igreja católica, Deus, no dizer de Paulo, estabeleceu em primeiro lugar os apóstolos, em segundo os profetas, em terceiro os doutores, depois o poder dos milagres, os dons de curar, de assistir, de governar, as diversidades das línguas, e toda outra virtude, quero dizer, a sabedoria e a inteligência, a temperança a justiça, a misericórdia e a bondade, a insuperável paciência nas perseguições.

Instruídos com os preceitos e modo de viver nesta Santa Igreja católica, possuiremos o reino dos céus e receberemos por herança a vida eterna. Por este motivo, agüentamos absolutamente tudo para a alcançarmos de Deus. Nossa meta proposta não é nada insignificante: a posse da vida eterna, esta é a nossa luta.

Portanto, a vida em sua realidade e verdade é o Pai, que pelo Filho no Espírito Santo, derrama qual fonte os dons celestes sobre nós, e por sua benignidade também a nos homens, nos foram firmemente prometidos os bens da vida eterna.



É importante compreender que “católica” não é um substantivo. Não é o nome da Igreja de Cristo: Igreja Católica. “Católica” é um adjetivo, uma qualificação essencial da Igreja do Senhor: Igreja católica – com “c” minúsculo. A palavra “católica” deriva da expressão grega “kat’olou”, que significa literalmente “segundo a totalidade”. São Cirilo explica que totalidade (= catolicidade) é essa da Igreja: totalidade porque é chamada a difundir-se por toda a terra, totalidade porque conserva a totalidade da doutrina verdadeira, totalidade porque é aberta a todas as pessoas de quaisquer condições, totalidade porque é enviada a perdoar todos os pecados, totalidade porque é rica dos dons e carismas com os quais o Senhor a enriquece.

A palavra “Igreja” deriva do grego “ekklesía”, que significa convocação, reunião, assembléia dos convocados. No Antigo Testamento, esta assembléia era o povo de Israel, reunido para escutar a Palavra do Senhor e dizer-lhe “amém”. No Novo Testamento, o novo povo é a Igreja, nascida da convocação feita por Jesus na sua pregação, na sua páscoa e no dom do Espírito Santo.

“Igrejas”, no plural, significa sempre o que hoje chamamos “dioceses”: uma comunidade cristã reunida em torno de um bispo legítimo e seus cooperadores, os padres, para escutar a Palavra de Deus e celebra a Eucaristia. Sempre foi muito claro na consciência dos primeiros cristãos que a Igreja de Cristo é indivisível, é una e única.

É importante recordar que Jerusalém, Sião, o povo de Israel, o templo, a Esposa do Cântico dos Cânticos são realidades do Antigo Testamento nas quais os Padres da Igreja sempre viram imagens da Igreja.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Patriarca da Etiópia diz ter visto a Arca da Aliança

O líder cristão Abuna Paulos disse que não pode revelar exatamente onde a arca está.

ROMA – O patriarca copta ortodoxo da Etiópia, Abuna Paulos, garantiu em Roma ter visto a Arca da Aliança, e que o objeto sagrado encontra-se “em bom estado de conservação”.

Paulos fez essa declaração durante a apresentação da construção, na cidade etíope de Axum, do Museu da Arca da Aliança, uma iniciativa de seu pontificado e da fundação Chrijecllu, presidida por Makonnen Haile Selassie, neto do último imperador etíope.

“A Arca da Aliança está há três mil anos na Etiópia e continua ali, aonde chegou por meio de um milagre e onde continua pela graça de Deus”, afirmou ele a jornalistas.

O patriarca copta acrescentou que não pode dizer onde está a arca, mas que era capaz de garantir que já a havia visto e que ela corresponde à descrição dada na Bíblia.

“Não é feita pela mão do homem, é uma coisa que Deus abençoou para que assim fosse. Vi-a com um sentimento de humildade, não com orgulho”, afirmou o líder religioso.

Paulos acrescentou que convidou o papa Bento XVI a visitar a cidade de Axum.

De acordo com a tradição copa etíope, a Arca, na qual foram guardadas as tábuas da lei dadas por Deus a Moisés, encontra-se na catedral de Tsion Maryam, em Axum.

A tradição etíope diz que o artefato foi levado a Axum pelo imperador etíope Menelik I, o lendário filho do rei Salomão com a rainha de Sabá.

Fonte: Estadão/EFE

domingo, 1 de novembro de 2009

Epístola 39: Sobre os Livros Canônicos da Bíblia.

ATANÁSIO DE ALEXANDRIA (295-373)

1. [Alguns hereges gnósticos] escreveram livros que chamam livros de mesa, que marcaram com estrelas, às quais deram os nomes dos Santos. Esses que escreveram tais livros em meio à verdade, atraíram sobre si uma reprovação dupla, porque se esmeraram numa ciência mentirosa e desprezível e desviaram, com ídéias maldosas, os ignorantes e os simples, da fé correta e estabelecida na verdade íntegra, sob a presença de Deus.

2. Já que os citamos como heréticos e assassinos, sendo nós os possuidores das Divinas Escrituras para a salvação, e já que temos, como Paulo escreveu aos Coríntios, que algumas poucas pessoas simples podem ser desviadas da simplicidade e pureza, pela astúcia de certas pessoas, e podem, no futuro, ler outros livros que são chamados apócrifos, iludidos pela semelhança de seus nomes com os dos livros verdadeiros, venho pedir-lhes que tenham paciência se eu também vos escrevo com intuito de lembrar-lhes assuntos com os quais estais familiarizados, levado pela necessidade e para o bem da Igreja.

3. Fazendo menção desse assunto, adoto para fundamentar meu propósito, a norma de Lucas Evangelista, dizendo por mim mesmo: Doravante como alguns têm o propósito de assumirem entre eles os livros chamados apócrifos, e misturá-los com a Escritura divinamente inspirada, sobre a qual fomos convictamente instruídos, como aqueles que "desde o início foram testemunhas oculares e ministros da Palavra, transmitida a nossos Pais, pareceu-me oportuno a mim também", impelido por irmãos verdadeiros e tendo a orientação dos primórdios, firmar para vós os livros incluídos no Cânon, transmitidos e confirmados como divinos, com o propósito de que, se alguém cair em erro possa acusar aqueles que o desviaram, e para que aqueles que continuam firmes na verdade possam de novo se alegrarem ao lhes serem tais fundamentos relembrados.

4. Há, portanto, 22 Livros do Antigo Testamento, número que, pelo que ouvi, nos foram transmitidos, sendo este o número citado nas cartas entre os Hebreus, sendo sua ordem e nomes respectivamente, como se segue: Primeiro, o Gênesis. Depois, o Êxodo. Depois, o Levítico. Em seguida, Números e, por fim, o Deuteronômio. Após esses, Josué, o filho de Nun. Depois, os Juízes e Rute. Em seguida, os quatro Livros dos Reis, sendo o primeiro e o segundo listados como um livro, o terceiro e o quarto também, como um só livro. Em seguida, o primeiro e o segundo Livros das Crônicas, listados como um só livro. Depois, Esdras, sendo o primeiro e o segundo igualmente listados num só livro. Depois desses, há o Livro dos Salmos, os Provérbios, o Eclesiastes e o Cântico dos Cânticos. O Livro de Jó. Os doze Profetas são listados como um livro. Depois Isaías, um livro. Depois, Jeremias com Baruc, Lamentações e a Carta [de Jeremias], num só livro. Ezequiel e Daniel, um livro cada. Assim se constitui o Antigo Testamento.

5. Não é tedioso repetir os [livros] do Novo Testamento. São os quatro Evangelhos, segundo Mateus, Marcos, Lucas e João. Em seguida, o Atos dos Apóstolos e as sete Epístolas [chamadas "católicas"], ou seja: de Tiago, uma; de Pedro, duas; de João, três; de Judas, uma. Em adição, vêm as 14 Cartas de Paulo, escritas nessa ordem: a primeira, aos Romanos, as duas aos Coríntios, uma aos Gálatas, uma aos Efésios, uma aos Filipenses, uma aos Colossenses, duas aos Tessalonicenses, uma aos Hebreus, duas a Timóteo, uma a Tito e, por último, uma a Filemon. Além disso, o Livro da Revelação de João.

6. Há fontes da salvação em que aqueles que têm sede podem saciar-se com as palavras vivas que contêm. Somente nelas está proclamada a doutrina divina. Que nenhum homem acrescente nada a elas, nem delas se apossem. Com respeito a isso, o Senhor envergonhou os Saduceus, dizendo: "Eles erram porque não conhecem a Escritura". Também reprovou os Judeus, dizendo: "Vejam as Escrituras porque elas são que dão testemunho de Mim".

7. Mas, para uma maior exatidão, acrescento também, escrevendo para não me omitir, que há outros livros, além desses, de fato não incluídos no Cânon, indicados pelos Padres para leitura por aqueles recém-admitidos entre nós e que desejam receber instrução sobre a Palavra de Deus: a Sabedoria de Salomão, a Sabedoria de Sirac, Ester e Judite, Tobias, bem como aqueles chamados Ensinamento dos Apóstolos e o Pastor. Quanto aos primeiros, meus irmãos, foram incluídos no Cânon; mas os últimos são [apenas] para leitura, não havendo em lugar nenhum menção a eles como sendo escritos apócrifos. Mas aqueles que são criação de heréticos, que os escreveram quando quiseram, aprovando-os eles próprios, datando-os de modo a usarem-nos como escrituras antigas, aqueles sim, se encontram em condições de desviarem as pessoas simples.
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