sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Reflexão do patriarca ortodoxo Abuna Paulus e resposta de Bento XVI

O Patriarca deu um aula sobre o cristianismo primitivo na africa.

Reflexão do Patriarca Abuna Paulus

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, Amém!
Queridos participantes desse grande congresso de Cardeais e Bispos.

Sinto-me honrado e privilegiado em ser convidado para este grande Sínodo e dar uma breve intervenção sobre a África e as Igrejas nesse continente. Sou especialmente grato a Sua Santidade, Papa Bento XVI, que me quis entre os senhores hoje e quem pessoalmente me testemunhou seu amor pela África e sua estima pela Igreja Ortodoxa Etíope Tewahedo, durante nosso último fraternal encontro aqui em Roma.

A África é o segundo maior continente. É a casa de todos os tipos de pessoas com uma grande variedade de cores que vivem em harmonia e igualdade.

Este espectro de cores é um dos de Deus para a África e adiciona beleza ao continente. É, mais que isso, a prova de que a África é um continente onde todos os tipos de pessoas vivem em igualdade não obstante as diferenças de cor e raça.
Antropólogos, filósofos e acadêmicos confirmaram que a África em geral, e a Etiópia em particular, é sem dúvida o berço da humanidade. E a Bíblia Sagrada confirma esta profunda convicção. A história, de acordo com o calendário etíope começa em Adão e Noé. Isso mostra que para os etíopes o início da humanidade, nosso presente e nosso futuro está marcado hoje e para sempre por Deus e Sua salvação.

A África, cuja dignidade ancestral de seu povo está escrita nas pedras do obelisco de Axum, nas pirâmides egípcias, em monumentos e manuscritos, não somente foi uma fonte da civilização. De acordo com a Bíblia Sagrada, a África também foi refúgio para pessoas que foram atingidas pela fome: este é o caso de Judeus no tempo de Jacó quando passaram sete anos no Egito.

A Bíblia Sagrada estabelece que os Judeus e o profeta Jeremias que sofreram grandes agressões dos Babilônios foram salvos na Etiópia e no Egito. Pessoas que viveram no Oriente Médio foram aliviadas de sua fome na Etiópia e no Egito.
O próprio Jesus Cristo e Santa Maria foram recebidos no Egito, enquanto fugiam da armadilha cruel de Herodes. Está claro que os africanos cuidam da humanidade!
A África permanece um continente religioso no qual vivem pessoas que acreditam em Deus Todo-poderoso há séculos. A Rainha de Sabá ensinou a seus compatriotas sobre o Antigo Testamento que ela aprendeu de Israel. Desde então, a Arca da Aliança está na Etiópia, na cidade de Axum.

O filho da Rainha de Sabá, Manlike I, seguiu seu exemplo e tratou de trazer a Arca da Aliança de Moisés para a África, para a Etiópia.

A história do eunuco e forte etíope, bom seguidor das Leis de Moisés, e as práticas e culturas religiosas que existem na Etiópia indicam que a Lei de Moisés foi praticada costumeiramente na Etiópia mais que em Israel. Isso ainda pode ser testemunhado pelo estudo cultural e pelo estilo de vida dos Etíopes.

Foi em Alexandria, no Egito, onde a Bíblia Sagrada foi traduzida em linguagens não hebraicas. Essa tradução africana é conhecida como a “Tradução das Setenta Escolas”. (´Sebeka Likawunt´)
A Sagrada Escritura indica que como nos antigos tempos do Antigo Testamento, os Africanos têm o costume da adoração pela lei de consciência no período do Novo Testamento.
O então rei dos reis etíope, imperador Bazen, foi um dos reis que foram a Belém para adorar o menino Jesus.

O Evangelho nos fala que havia na África, um homem da Líbia, chamado Simão de Cirene que tomou sobre si a Cruz de Jesus enquanto Ele ia para o Gólgota.
E vejam, um eunuco Etíope veio a Jerusalém em 34 AD para adorar a Deus de acordo com a Lei de Moisés. Por ordem do Espírito Santo, o eunuco foi batizado por Felipe. Após seu retorno para a África, o eunuco pregou o Cristianismo a sua nação. Então a Etiópia se tornou a segunda nação depois de Israel a acreditar em Cristo; e a Igreja Etíope se tornou a primeira Igreja na África.
Grandes histórias de fé marcaram os primeiros séculos do Cristianismo na África porque os africanos sempre viveram uma profunda caridade e uma grande devoção ao Novo Testamento.

A África é a região da qual celebraram os escolásticos e os padres religiosos, de onde S. Agostinho, S. Tertuliano, S. Cipriano, como também, S. Atanásio e S. Kerlos vieram. Esses padres são celebrados em todos os continentes em no mundo todo.
S. Yared que compôs lindos hinos da Igreja e quem o mundo reconhece por sua criatividade fora do comum, também é originário da África. S. Yared é um filho da Etiópia. Os hinos de S. Yared estão entre as maravilhas do mundo pelo que a Etiópia é conhecida no mundo. Os feitos desses Padres caracterizam a África.
De acordo com os escolásticos é na África que o primeiro Cânon da Bíblia Sagrada foi definido.

A história também nos relembra do martírio de Cristãos no Norte da África quando, seu rei, um descrente, baixou a espada contra eles na tentativa de destruir completamente o Cristianismo. Ao mesmo tempo, Cristãos que foram maltratados e perseguidos em diferentes partes do mundo vieram para a África, especialmente para a Etiópia que viveram em paz na região.

Devotados etíopes demonstraram também sua incrível hospitalidade aos nove Santos e outras dezenas de centenas de cristãos que foram perseguidos na Europa do Leste e vieram para a África em grupos. As residências e as tumbas desses cristãos perseguidos foram mantidas como santuários sagrados em várias partes da Etiópia.
Na África e na Etiópia temos partes da Santa Cruz. A parte direito da Cruz foi mantida na Etiópia, em um lugar chamado Montanha Goshen.

A Cruz de Cristo foi carregada também por cristãos da África. Penso agora na minha Igreja que recentemente sofreu uma dura perseguição durante a ditadura comunista, com muitos novos mártires entre eles o Patriarca Theophilos, e antes dele, abuna Petros, durante o período colonial. Eu mesmo, quando bispo, passei longos anos na cadeia antes de ser exilado. Quando me tornei Patriarca, após o fim do comunismo, havia muito que reconstruir. Este tem sido nosso trabalho, através da ajuda de Deus, da oração de nossos monges e da generosidade dos fiéis.

A África é potencialmente um continente saudável, com solo fértil, recursos naturais, e uma variedade de espécimes de plantas e animais. A África tem um clima adaptável e possui muitos minerais preciosos. Por que tem sido um continente com muitos recursos naturais inexplorados, muitos mantém seus olhos aí. Isso é também inegável que o ganho da civilização de outras partes do mundo é resultado do trabalho e dos recursos da África.

Os africanos fizeram esse abençoado trabalho para o mundo. O que o mundo fez por eles?

A África foi pessimamente colonizada e seus recursos foram explorados. As nações ricas que exploram os recursos da África só se lembram da África quando precisam de algo dela. Eles não ajudam o continente em sua luta pelo desenvolvimento total.
Cada e toda nação do continente tem vários problemas e desafios. O problema pode ser social, político, econômico, bem como espiritual.

Enquanto a qualidade de vida do povo africano é menor que a do resto do mundo, existem algumas razões porque tais padrões de vida pobres ficam piores e se espalham por todo o continente. A falta de acesso à educação é o maior problema no qual a juventude, como resultado, falha em ter suficiente educação. Nenhuma nação e povo chega ao desenvolvimento a a prosperidade sem educação e conhecimento.

Da mesma forma estamos preocupados, a pandemia de HIV/SIDA não pode ser evitada sem grandes esforços. Entretanto, deveríamos encorajar todas as experiências que nos mostram como curar e resistir ao mal, a dar esperança para a sinergia criadora e providenciar à África os mesmos tratamentos que a Europa recebe. Ao mesmo tempo outros tipos de doenças são constantemente tratadas de modo inadequado. Clamamos ao mundo para que trabalhe em harmonia sobre esse aspecto. O Conselho das Igrejas Africanas está a realizando esforços para diminuir os problemas que ocorrem no continente, especialmente o caos criado por extremistas. Líderes religiosos do Cristianismo e fiéis em geral deveriam dar-se as mãos nessa empreitada.

Em muitos países africanos, as necessidades básicas como alimento, água potável, e segurança não existem. Muitos africanos são vulneráveis devido a falta de muitos serviços básicos. A África declarou a sua liberdade do colonialismo há muito tempo, mas ainda depende muito das nações ricas. A prática tradicional da agricultura e uma insatisfatória introdução dos sistemas de agricultura modernos e a dependência da chuva causam um impacto negativo na segurança alimentar, a migração e a fuga de cérebros está a afectar seriamente o continente.

A África está acorrentada por pesadas dívidas globais que nem a presente geração nem a futura poderão suportar.
Em que modo poderíamos denunciar as guerras civis que são combatidas habitualmente por crianças-soldado, que também são vítimas desses trágicos atos violentos? Como podemos condenar o deslocamento e a latente migração das populações?

A Declaração Internacional dos Direitos do Homem claramente estabelece que qualquer pessoa menor de 18 anos não pode ser membro de um grupo armado porque ele é uma ‘criança’. Entretanto, alguns países estão constantemente forçando crianças menores de 18 anos a entrarem no serviço militar. Isto é uma clara violação dos direitos humanos. Logo, é imperativo para os líderes das Igrejas Africanas chorar em uma só voz para que esse comportamento pare de uma vez.
Então, gostaria de usar o palco para urgir a todos os líderes religiosos a trabalharem pela paz e proteger os recursos naturais que Deus nos deu, e defender a vida e a inocência das ciranças.

Em um significante número de países Africanos, as necessidades básicas como comida e água potável, segurança não existem. Falando em geral, muitos africanos vivem em uma situação na qual há um tipo de escassez de muitas das necessidades e serviços humanos básicos. Embora a África tenha declarado sua liberdade do colonialismo há muito tempo, ainda existem muitas circunstâncias que a fazem dependente de países ricos. A enorme dívida, a exploração de seus recursos naturais por muitos, a prática da agricultura tradicional e a insatisfatória introdução de sistemas modernos de agricultura, a dependência de seu povo da chuva que causa um impacto negativo na garantia da segurança alimentar, a migração e a vazão das mentes de seu povo afetam enormemente o continente.

Estou esperançoso que como os cardeais e bispos Africanos discutiram esse tema previamente, hoje este grande sínodo poderia discutir o tema e propor possíveis soluções.
Acredito que nós, líderes religiosos e Cabeças das Igrejas, temos uma única tarefa e responsabilidade: conhecer e sustentar, quando crermos necessário, as sugestões que vêm do povo, como, ao contrário, para as rejeitar quando contradizem o respeito e o amor pelo Homem, que tem suas raízes no Evangelho.

Espera-se que os cristãos, de fato, sejam mensageiros de mudanças para trazer a justiça, a paz, a reconciliação e o desenvolvimento. Isto é o que vejo perseguido com determinação e humildade pela Comunidade de Sant´Egídio em toda África: frutos de paz e cura são possíveis, e eles minam todas as formas de violência, com a força e a inteligência Cristã do amor. Os líderes religiosos africanos não só tem que estar preocupados com esses trabalhos sociais mas também responder às grandes necessidades espirituais das mulheres e dos homens da África.

O Apostolado e o trabalho social não podem ser tratados separadamente. O trabalho social é o significado do apostolado. Cada palavra deve ser traduzida em prática. Portanto, após cada palavra e promessa, ações práticas precisam seguir. Espera-se também dos padres religiosos que aumentem a percepção do público em honrar os direitos humanos, a paz e a justiça. A sociedade precisa de ensinamentos de seus padres religiosos em uma oferta de ajudá-los a resolver seus problemas em unidade e a livrá-los de serem alvos de um problema.

Então, líderes das Igrejas Africanas, com o poder de Deus Todo-poderoso e do Espírito Santo, precisam falar a linguagem da Igreja. É também necessário ver quando, como e a quem falar. Isto deveria ser feito da segurança das Igrejas.
Estou verdadeiramente feliz em participar deste Sínodo da Igreja Católica para a África. Sou africano. Minha Igreja é a mais velha da África: uma Igreja de Mártires, Santos e monges. Trago o meu apoio como amigo e irmão a este empenho da Igreja para a África. Agradeço mais uma vez Sua Santidade pelo convite e desejo-lhe uma vida longa e um ministério frutuoso.
Falemos do Evangelho de Jesus Cristo ao coração dos Africanos e Jesus retornará a África, como ele fez quando era um menino, junto da Virgem Maria. E paz, misericórdia e justiça virão junto com Jesus!
Que Deus abençoe as Igrejas na África e os seus pastores! Amém!


* * *

Resposta de Bento XVI

Sua Santidade,
Agradeço-lhe do fundo do coração pela sua atenciosa apresentação e por ter aceitado o meu convite para participar desta Segunda Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos. Tenho a certeza de que a minha gratidão e o meu apreço são partilhados por todos os membros da Assembleia.
A sua presença é uma eloquente testemunha da antiguidade e das ricas tradições da Igreja na África. Desde os tempos apostólicos, entre as várias pessoas ansiosas por escutar a mensagem de salvação estavam também pessoas vindas da Etiópia (cf. At 8:26-40). A fidelidade do seu povo ao Evangelho continua a ser evidente não só na sua obediência à sua lei de amor, mas também, como nos lembrou, na perseverança no meio das perseguições e do supremo sacrifício do martírio em nome de Cristo.

Sua Santidade relembrou que a proclamação do Evangelho não pode ser separada do compromisso de construir uma sociedade segundo a vontade de Deus, que respeite as bênçãos da sua criação e proteja a dignidade e a inocência de todas as suas crianças. Em Cristo nós sabemos que a reconciliação é possível, que a justiça pode prevalecer e que a paz poder durar! Esta é a mensagem de esperança que nós somos chamados a proclamar. Esta é a promessa que os povos de África há muito esperam ver cumprida aos nossos dias.

Oremos, então, para que as nossas Igrejas possam estar mais próximas da unidade que é dom do Espírito Santo, e para que sejam testemunhas da esperança trazida pelo Evangelho. Continuemos a trabalhar para o desenvolvimento integral de todos os povos da África, fortalecendo as famílias que são o bastião da sociedade africana, instruindo os jovens que são o futuro da África e contribuindo para a formação de sociedades que se distingam graças à honestidade, à integridade e à solidariedade. Que as nossas deliberações durante estas semanas possam ajudar os seguidores de Cristo em todo o continente a serem exemplos convincentes de rectidão, misericórdia e paz, e a luz que guia o caminho das futuras gerações.

Sua Santidade, agradeço-lhe mais uma vez pela sua presença e pelas suas válidas reflexões. Possa a sua participação deste Sínodo ser uma bênção para as nossas Igrejas.

[©Libreria Editrice Vaticana]

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